sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O SOBRENATURAL (de Bosco Silva)



O telefone já devia estar tocando a alguns minutos naquela manhã quando fui, cambaleando de sono, atendê-lo. Do outro lado da linha, minha tia dizia- me que meu tio, seu irmão, acabara de falecer. O choque da surpresa fez meu sono passar instantaneamente. Fui para um dos quartos, o qual estava fechado com a chave para o lado de fora da porta, para pegar algo, talvez uma caneta. Ao sair do quarto, noto que a chave não se encontrava. Procuro-a na sala, no corredor, na cozinha, etc. Volto novamente para o mesmo quarto. Procuro-a debaixo da cama, ao redor da mesma, em cima das prateleiras, etc. Não a encontro. Olho para o criado-mudo e vejo um papel dobrado, cuidadosamente em forma de quadrado, que chama minha atenção. Pego-o, desdobro-o, lentamente... E qual não foi minha surpresa ao descobrir que a chave se encontrava cuidadosamente embrulhada no mesmo papel! A dúvida, misturada ao espanto, invadiu minha mente, naquele momento, sóbria. Como a chave teria ido parar lá?! Se não havia outra idêntica e eu estava só! Teria sido eu que a teria embrulhado, cuidadosamente, naquele papel, e não lembrava? Ou seria este mais um dos ditos fenômenos sobrenaturais, em que não encontramos explicações óbvias? Bem, sempre há espaços para dúvidas.
Contudo, não era a primeira vez que fatos estranhos, como esse acontecia. Fatos, assim, são comuns em minha família: sons de passos, quando não há ninguém por perto, espectros humanos desconhecidos, descrições semelhantes sobre fenômenos estranhos, sobre nossa casa, por pessoas de dentro e fora da família, etc.
Para um cético, como eu, tais fenômenos poderiam ser explicados pela extrema crença adotada por tais pessoas, por sua imaginação, ou por processos inconscientes, o que em muitos casos parecem se confirmar, por exemplo, quando pessoas ditas médium, durante estados de transe, supostamente recebem entidades de personalidades e comportamentos extremamente diferentes do próprio médium. Porém, quando analisadas por pessoas que conhecem bem a personalidade e o comportamento do dito médium, percebe-se que a tal entidade se resume a fatos vividos pelo próprio médium. Como o exemplo, que tive oportunidade de observar, em que uma pessoa conhecida, durante um estado de transe, teria supostamente recebido o espírito de um malandro. Porém, tal entidade ao verbalizar palavrões ou gírias, não ia além dos palavrões e gírias conhecidas pelo próprio médium, o que no mínimo soa como estranho, já que as expressões de gírias e palavrões possuem uma variedade extremamente grande. No entanto, se resumia a uma quantidade pequena que o próprio médium, sendo uma pessoa educada e não afeito a ambientes e atos de malandros, conhecia.
Ou a sensação que algumas vezes podem ocorrer, quando, algum tempo após deitarmos e fecharmos os olhos sentimos a sensação de parte do colchão atrás de nós afundar, pouco a pouco, como se alguém cuidadosamente se deitasse ao nosso lado, não querendo nos acordar. E ao sentirmos isso, viramos a cabeça para verificar quem é, e ao olharmos verificamos que não há ninguém! O medo e o espanto apoderam-se de nós, nesse momento e nos persegue durante outras noites. O medo que dá próxima vez se repita e que a visão seja terrível. O medo poderia se desfazer ao percebermos que tudo não passou de sonho. E que a sensação de estar acordado ou dormindo, não possui nenhuma diferenciação, nem mesmo ínfima! O que gera toda a confusão entre estar acordado ou dormindo.
Há ainda os chamados corpos incorruptíveis: corpos humanos mortos que após dezenas ou mesmo centenas de anos, permanecem no mesmo estado como se estivessem vivos. Como o de Santa Bernardette, morta em 1879, tendo o seu corpo, de modo natural, sido preservado intacto até aos nossos dias. Assim como os de vários outros santos.

Santa Bernardette, morta em 1879. 
Seu corpo permanece incorruptível até nossos dias

Durante a exumação de seu corpo em 1909, a comissão encarregada de investigar sua santidade, encontrou seu corpo intacto, como no dia de seu sepultamento, com uma única diferença, seu hábito estava molhado. “Sepultada, foi novamente exumada em 1919, sob as vistas de testemunhas leigas e religiosas. Os médicos que examinaram o corpo escreveram: ‘Quando o caixão foi aberto o corpo parecia estar absolutamente intacto e sem nenhum odor post mortem. Não havia cheiro de putrefação e nenhum dos presentes experimentou qualquer desconforto’. Uma terceira exumação foi feita em 1923 e o cadáver encontrava-se nas mesmas condições. Desta vez, o corpo foi aberto (necropiciado) e os órgãos internos estavam flexíveis. Um médico escreveu: ‘O fígado estava leve e sua consistência era praticamente normal’.”1
Antes, porém, que possam demonstrar ceticismo, convém esclarecer que tal fato não acontece apenas com santos católicos, embora alguns afirmem o contrário, ou de outros credos, mas também com pessoas comuns, acometidas pelo processo natural chamado adipocere, em que um corpo estando protegido de insetos, como moscas e larvas, em ambiente com pouco oxigênio e úmido, com certa dose de alcalinidade e temperatura constante, começa ter seu tecido transformado, lentamente em sabão. O que protege o resto do corpo, lhe mantendo preservado. Como o ocorrido na cidade de Acapetahua no México. Foi uma grande surpresa para a família do morto, durante a exumação, constatar que apesar deste ter sido assassinado há 65 anos, seu corpo permanecia intacto como se acabara de morrer, sem exalar qualquer mau cheiro. Durante a tentativa de abrir a sepultura, os coveiros ainda feriram o pé do morto, o qual não sangrou, mas ficou em carne viva!2

Acma, foto de Victor Chamlatti em vida

Foto durante a exumação

Acima, outro caso de adipocere:
criança sepultada em 1912, exumada em 1995

Porém, há fatos que nos desafiam e que questionam nosso ceticismo. Até mesmo de um cético, como eu! Casos, por exemplo, de visões - vistas até por mim próprio -, de imagens humanas bem delineadas, que foram atestadas por mim, como não sendo o reflexo de nenhum objeto ou formação casual dos mesmos, e que foram vistas somente por mim. Caso como o acontecido comigo, há muitos anos atrás, quando era menino. Ao acordar assustado em meio à imensa escuridão ao qual se encontrava o quarto, procurei incessantemente algum sinal luminoso que demonstrasse não estar cego, e afastasse tão desagradável sensação. Ao procurar por todos os lados, notei a presença, ao meu lado esquerdo de uma figura com traços humanos a segurar uma luz. Não podia ver toda a figura, mas podia visualizar um dos braços, o qual segurava a luz, e parte de seu vestido branco com fita vermelha, o rosto e outras partes do corpo não me era possível ver, estavam tomados pela escuridão. Até esse momento não havia temor. Porém, ao tentar identificá-lo, chamando-o pelos nomes de meus familiares e não obtendo resposta, a sensação de medo apossou-se de mim. Imediatamente levantei-me da cama e fui para outra, da qual olhava assustado para o mesmo lugar onde tal figura aparecera. Porém, ela já não estava lá. Da cama verifiquei a total ausência de reflexos ou objetos que poderiam explicá-la.
Sonho? Alucinação? Talvez. Alguns dizem que é preciso adaptar a mente a fatos novos, desde que comprovados pelos sentidos ou pela razão. E, assim, mesmo que um dia uma xícara, por exemplo, nos dizer bom dia, devemos respondê-la, sem nenhum choque de surpresa. Mas a verdade é que nossa primeira reação é duvidar de nossos sentidos ou de nossa mente, ou ainda de nossa sanidade mental. Pois, foi o que aconteceu, segundo o que nos conta uma conhecida revista de divulgação científica3, com Maurício Casagrande:
No rádio tocava Oceano, de Djavan. Maurício ia de São Paulo a Santos e acabava de entrar no primeiro túnel da Rodovia dos Imigrantes. Foi quando sentiu um calafrio e ouviu:

– Ai, gosto tanto dessa música.
– Tia, o que a senhora está fazendo aqui? Disse Maurício, reconhecendo a voz.
– Ué, estou indo para a praia, responde a tia, com naturalidade.
– Mas a senhora não pode. A senhora está morta faz uma semana.

Dona Rosa, a tia de Maurício que apareceu no carro de repente, reclamava de que estava perdida e ninguém tinha ido buscá-la. “Só vi o Zé [o irmão dela], mas parecia que ele estava de fogo”, disse. Sem saber o que fazer, o sobrinho sugeriu que ela aguardasse para seguir seu caminho. Antes de sumir do veículo, a mulher agradeceu a coroa de flores e só não deixou mais perplexo o administrador e engenheiro eletricista Maurício Casagrande porque essa não era a primeira vez que algo parecido acontecia. As primeiras manifestações estranhas apareceram na infância, mas foi depois dos 27 anos que ele passou a protagonizar cenas de horror: acordava durante a noite e via figuras cadavéricas no quarto, ouvia vozes e começou a adivinhar data e hora da morte de pessoas próximas. Entre o susto e o incômodo, buscou ajuda médica com psicólogos, psiquiatras, neurologistas. Nunca encontrou nada errado.
Maurício chegou a dormir duas noites no Hospital São Paulo, vigiado por equipamentos de mapeamento cerebral, e a tomar ansiolíticos, que não o impediram de continuar acordando com presenças fantasmagóricas. Apesar das inúmeras tentativas, não se descobriu nenhum transtorno mental.
As consultas médicas também fizeram parte da adolescência de Regina Braga, hoje com 52 anos. Aos 15, ela começou a acordar rodeada de estranhos. “Eram figuras grotescas. Eu via pessoas com os olhos esbugalhados em cima de mim. Comecei a entrar em parafuso”, diz. Os pais passaram a levá-la a médicos, que receitavam calmantes. “O tranqüilizante era uma porta de acesso maior. Eu relaxava, ficava indefesa e os ataques à noite eram mais ferozes.”     
E o que pode a ciência, esse deus de ateus, dizer sobre tais fenômenos. Para a ciência tudo se resume a mero fruto da imaginação ou a alucinações provocadas pelo próprio funcionamento de nosso cérebro.
Apesar dos vários meios inventados, como a ressonância magnética, a tomografia computadorizada e outros, a capitação do que provoca estes estados de consciência está muito aquém do que se deseja. Tal é a explicação para que estados como o de Maurício não possam ser explicados, segundo os cientistas.
Contudo, a epilepsia passou a ser um ponto chave para tentativas de explicá-los.
Os ataques epiléticos podem provocar alucinações semelhantes a experiências sobrenaturais. O que levou alguns pesquisadores a conceberem a possibilidade que reações semelhantes às epiléticas possam ser a causa das chamadas experiências sobrenaturais.
 O médico Olaf Blanke, da Escola Politécnica de Lausanne, na Suíça, criou em laboratório aquela sensação desagradável de ter uma presença parada às costas. A cobaia foi uma mulher de 22 anos, com epilepsia, que se submetia a uma cirurgia para retirar a lesão que provocava as crises4.
A equipe de Blanke aplicou estímulos elétricos em pontos do lado esquerdo do cérebro. A reação foi sinistra: a mulher sentiu que alguém estava atrás dela. Empolgados, os médicos estimularam ainda mais a área e a paciente foi capaz de descrever o ser invisível como uma pessoa jovem. Os pesquisadores, então, pediram que ela tentasse abraçar os joelhos. Ao se abaixar, a mulher podia jurar que a presença que sentia tinha segurado seus braços5.
No entanto, tais sensações também podem ser produzidas por outros meios. Como por ondas eletromagnéticas.  O neurologista canadense Michael Persinger faz testes com ondas eletromagnéticas em pessoas normais. A experiência consiste em colocar capacetes, que geram uma espécie de campo magnético, em voluntários vendados, dentro de uma sala escura e com isolamento acústico. À medida que o pesquisador estimula o lobo temporal, os voluntários têm sensações de fazer inveja a qualquer usuário de alucinógenos: olhos que se mexem e viram luzes roxas, visões de incêndios, demônios, des­locamento do corpo e cenas da infância como se acontecessem no presente6.
Para a neurologia, ver espíritos é resultado de uma disfunção cerebral ainda não diagnosticada. Os sintomas são parecidos com os de doenças como epilepsia, esquizofrenia (que provoca alucinações auditivas e delírios de perseguição), tumores cerebrais (que podem causar alucinações) e transtorno de identidade dis­sociativa, quando o doente tem dupla identidade, ouve vozes e muda sua caligrafia. Mas a causa seria bem diferente da dessas doenças e estaria relacionada a erros de sinapse do cérebro. “Se há áreas do cérebro capazes de fazer contatos por telepatia, a ciência simplesmente não tem como refutar ou comprovar”, diz a neurologista Kátia Lin.  Talvez nem mesmo o cérebro abrigue todas as explicações.7
Contudo, esses são apenas uma parcela de fenômenos descritos como sobrenaturais. Como explicar cientificamente fatos como o do tecladista do conjunto Mamonas Assassinas que horas antes, em uma gravação de vídeo, demonstrou preocupação com um sonho, em que um avião se acidentava, que tivera uma noite antes, do acidente aéreo que vitimou suas vidas.
Coincidência? Ou o poder misterioso de prever a própria morte?
A verdade é que, embora sejamos crentes por natureza, ainda sabemos muito pouco sobre tais fenômenos, e enquanto as brumas que os envolvem, não si dissiparem mantenho-me cético, porém, com reservas!

FONTES:

1. sobrenatural.org
3. Revista Super interessante: Eles Vêem Espíritos / edição 237 – Março 2007
4. Idem
5. Idem
6. Idem
7. Idem  

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