AO LEITOR
Antes que você, meu
caro leitor, se pergunte, com horror em seus olhos, “o que deve se passar na mente de alguém que escreve sobre estupro,
incesto, pedofilia, blasfêmia, bestialidade...” - pergunta tantas vezes
feita a mim em silêncio -, chegando a concluir, erroneamente, a existência de certa atração
criminosa do autor por tais práticas, devo lhe dizer que, em primeiro lugar,
você desconhece uma das grandes funções da arte, e, certamente, um dos grandes
motivos que alimenta o artista em sua prática: o prazer de criar mundos novos com
o poder inesgotável da imaginação; o que não quer dizer que o autor não
participe com sua experiência de vida em sua obra, mas que, sendo uma obra de
ficção, a imaginação é o elemento fundamental para sua feitura. Portanto, nunca
confunda o autor com sua obra: o escritor com o livro, ou o ator com seu
personagem.
Gostaria também de lhe
dizer que grande parte de seu horror se deve ao seu total desconhecimento da
obra daquele que, sem dúvida, é o grande personagem do livro, o escritor francês
Marquês de Sade: autor que passou grande parte de sua vida em hospícios e
presídios por suas ideias e por seu comportamento sexual desregrado, com obras
contendo práticas sexuais tidas como não convencionais; e, por fim, tornando-se (negativamente) conhecido ao tornar-se modelo, emprestando seu nome ao conceito
psiquiátrico de sadismo: “prazer em infligir dor ou humilhação ao outro; bem
como de sentir prazer com o sofrimento alheio”.
E como escrever um
livro sobre Sade sem que choque uma grande parte do público, por conter descrições
cruas e duras da sexualidade humana, que lhe fizeram ser tão original em sua
arte? Impossível sem perder a coerência de seu pensamento. Pois esta é a tarefa
que se propõe o texto presente: trazer Sade através de seu pensamento e obra,
por meio de uma divertida história policial, cheia de humor e reviravoltas, ao
nosso moderno mundo, cheio de turistas sexuais e de saites pornôs da internet, capazes
de saciar os gostos sexuais mais extremos de seus milhares de frequentadores. A obra tem também a tarefa de mostrar o quanto ainda é útil o pensamento de Sade na análise da sexualidade humana.
Por fim, aconselhamos
ao leitor que prosseguir com sua leitura: leia o livro tendo em vista tais ideias,
esquecendo por um breve momento suas concepções morais sobre o tema; e aos
leitores que porventura possam se ofender com o que nele está contido, não
culpe o autor pela descrição crua da sexualidade humana, mas culpe a vida por
ela não ser como você gostaria que fosse.
O autor
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