A MORTE DE DANIELA PEREZ E O SUPOSTO RITUAL SATÂNICO

A MORTE DE DANIELA PEREZ E O SUPOSTO RITUAL SATÂNICO

Sempre que alguém é assassinado com extrema violência, com mutilações, faltando partes específicas do corpo — mãos, coração, olhos e órgãos genitais —, e que há algum suposto simbolismo envolvido, como números que possua alguma importância religiosa, o público é levado imediatamente a interpretar tais significados como a evidência de que tais assassinatos foram obras de rituais satânicos. Na maior parte das vezes, a mídia é a primeira a tirar esta conclusão. Primeiro porque crimes envolvendo supostos rituais satânicos chamam muita atenção do público, e consequentemente, dá muito lucro aos meios de comunicação, que exploram o ocorrido ao máximo.

São muitos os exemplos, principalmente em que preconceitos religiosos levam pessoas, ou a própria imprensa, a interpretar religiões que fogem da concepção cristã, de satânicas, simplesmente por puro desconhecimento ou por estas seitas não se adequarem a crença religiosa da maioria. E foi isso que aconteceu com o caso que ficou conhecido como o Caso Evandro (ilustração ao lado), ocorrido na cidade de Guaratuba no Paraná, em 1992, em que um grupo de pessoas ligadas a cultos de religiões de matriz afro, incluindo a mulher e a filha do do prefeito da cidade, foram acusados de matarem o menino Evandro, que foi encontrado sem as mãos e com o abdome aberto, como sacrifício humano. Tempos depois, por meio de gravações, descobriu-se, que os envolvidos, assumiram a culpa devido tortura policial.

Outro caso foi o Caso dos Meninos Emasculados de Altamira, ocorrido entre os anos de 1989 e 1993, em que a líder da seita Lineamento Universal Superior, Valentina de Andrade, e demais membros, foram acusados de serem membros de uma seita satânica que teria sido os responsáveis por ter extraído órgãos sexuais para rituais satânicos de crianças que haviam aparecido mortas em regiões de mata do município de Altamira, no estado do Pará. 

Tempos depois, se descobriu o verdadeiro responsável, Francisco das Chagas Rodrigues de Brito, um serial killer maranhense que havia assassinado crianças no Maranhão e que havia morado em Altamira. Francisco apontou a região em que havia matado algumas crianças, provando ser o verdadeiro assassino.

O recente documentário Pacto Brutal - o Assassinato de Daniella Perez, trouxe à tona o famoso assassinato da atriz Daniella Perez, morta pelo ator Guilherme de Pádua, ocorrido em 28 de dezembro de 1992. 

O caso também foi associado a ritual satânico, e como tal bastante explorado pela imprensa da época, pelo fato de:

• O corpo de Daniella ter sido supostamente encontrado próximo de uma árvore --- segundo tal relato sacrifícios humanos seriam sempre feitos próximos de árvores;

• Daniella foi encontrada em meio a um círculo queimado, e com as bordas queimada recentemente;

• Foi encontrada com a mão direita com uma substância vermelha;

• Daniella teria recebido o primeiro golpe no pescoço --- segundo alguns, sacrifícios humanos começam com cortes no pescoço;

• Ela também havia levado 12 estocadas em torno do coração --- o número 12 foi logo associado aos 12 apóstolos de Cristo e aos 12 zodíacos;

• Uma mecha do cabelo da atriz foi retirado, segundo alguns, como parte do ritual;

• Não havia sangue no local, como se todo o sangue da atriz tivesse sido “misteriosamente” drenado --- logo se sugeriu que o sangue teria sido drenado para ser usado como oferenda no suposto ritual satânico;

• Atores, colegas de novela do assassino Guilherme de Pádua, afirmaram que ele andava com a imagem em gesso de um Preto Velho --- logo associaram a imagem do Preto Velho ao suposto sacrifício humano de Daniella Perez. 

Não Foi Ritual Satânico

O fato do corpo de Daniella Perez ter sido encontrado próximo a uma árvore, não é evidência de nada, afinal era muito provável haver uma árvore próxima, pois o local era região de mata.

Pelas fotos de Daniella morta não parece ter sido ela encontrada em meio a um círculo queimado, pois não se vê isso, mas, sim, mato no local.

A misteriosa substância vermelha em sua mão, poderia ser simplesmente sangue que caiu sobre sua mão durante seu assassinato.

Daniella poderia ter recebido o primeiro corte no pescoço simplesmente porque era a região mais próxima da altura da assassina/assassino.

A imagem dos furos na camiseta de Daniella contradiz que foram ao redor de seu coração; e o fato de ter sido neste órgão demonstra que os assassinos queriam matá-la sem deixar possibilidade que ela sobrevivesse; e as doze estocadas seriam apenas uma quantidade aleatória, sem significado simbólico.

A mecha de cabelo tirado de Daniella, e apontado como parte do suposto ritual, é relativamente comum em casos de assassinatos, em que assassinos levam coisas sem valor, como pequenas lembranças do assassinato, sendo comum levarem peças íntimas, carteiras de identidade, etc.

O fato de não haver sangue da vítima no local em que foi encontrada, não possui nada de sobrenatural ou místico, apenas significa que a vítima não foi morta no local, possivelmente ela foi morta dentro do carro do assassino Guilherme de Pádua. O que é confirmado pelo fato do carro dele ter sido lavado, e um lençol cheio de sangue ter sido encontrado no apartamento do casal assassino; lençol que foi visto dentro do carro.

A Mãe, Glória Perez, ao Lado da Filha, Daniella Perez

Quanto à figura de um preto velho, que acabou por ser associado ao crime, trata-se apenas de preconceito religioso. Aliás é importante salientar, que no documentário Pacto Brutal - O Assassinato de Daniella Perez, Glória Perez, mãe de Daniella Perez, evita associar o assassinato de sua filha a qualquer forma de ritual satânico, e principalmente, não reproduz os relatos sobre a imagem do Preto Velho, certamente, para não alimentar preconceitos religiosos contra religiões de matriz africana. 

A morte da atriz Daniella Perez não foi nenhum sacrifício satânico, como quis aparentar a mídia da época. Mas o fruto de ódio, inveja e ciúmes doentio de dois psicopatas narcisistas, que queriam o sucesso e os holofotes para si, nem que para tanto precisasse destruir os obstáculos que os impedisse de conseguir o sucesso.