sábado, 17 de setembro de 2022

O SILÊNCIO DA CASA FRIA (RESENHA)



O SILÊNCIO DA CASA FRIA (RESENHA)

Sinopse

Elsie Bainbridge, após a morte do marido, Rupert, em circunstâncias misteriosas, parte com Sarah, prima do falecido, para a velha casa de campo da família de Rupert, que estava há décadas sem a visita familiar, para enterrá-lo. Elsie encontra uma casa decadente e envolta em mistérios, com moradores da pequena cidade de Fayford que evitam a todo custo se aproximarem da casa e de seus moradores, devido às histórias sombrias sobre seus antigos moradores e mortes de antigos empregados. 


Logo na primeira noite, Elsie é acordada por um incômodo barulho de madeira serrada, vindo de um cômodo que durante séculos se manteve fechado.


Um dia, após várias tentativas de abrir a porta, e não conseguir, eis que a porta se abre por ela mesma. Elsie e Sarah entram e então descobrem em seu ambiente o diário de uma antiga antepassada da família, datado de 1635, e também duas figuras pintadas e recortadas em madeira --- um menino camponês, segurando um bastão, e uma menina, segurando uma cesta de flores e ervas na altura da cintura, com a mão direita segurando uma flor branca junta ao peito. As figuras são chamadas de companheiros silenciosos, usados durante os séculos XVII e XVIII para servirem de companhia, enfeitar cômodos ou pregar peças em convivas desavisados. Sarah pede para ficar com a figura da menina, e a põe no salão principal. É a partir desse momento que as coisas começam a ficar ainda mais misteriosas na velha casa de campo, pois parece haver algo esquisito com o companheiro que começa a dar a impressão de movimentar os olhos e a aparecer em locais diferentes de onde fora inicialmente posto, além do surgimento de novas figuras com aparências desagradáveis…  


Companheiros silenciosos



O uso dos chamados companheiros silenciosos --- em inglês, silent companions, e título original do romance, até então desconhecidos da grande maioria dos leitores --- em uma história de terror foi uma grande sacada da autora, pois, por si só, estes objetos já evocam situações bizarras e assustadoras. O que faz com que eles mereçam um capítulo à parte em uma resenha do livro.




Estes objetos eram verdadeiras obras de arte, feitas com o uso da técnica conhecida por trompe l’oeil (enganar o olho) para que fossem capazes de imitar a textura de pele, tecido, e dar noção de dimensões reais de uma pessoa. Eram bastante populares na Holanda e na Inglaterra, durante os séculos XVII e XVIII. E apenas pessoas ricas eram capazes de comprá-las.


A Escrita

O romance O Silêncio da Casa Fria, de Laura Purcell, foi publicado em 2017, e tem como modelo os romances de terror gótico do século XIX, com uma pegada de gore dos tempos atuais. Sua narrativa se divide em três linhas de tempo:

 

Começa com Elsie Bainbridge, em 1865, muda e presa na cela de um hospício, acusada de assassinatos e de ter queimado a casa de seu marido; depois relata sua chegada e os acontecimentos misteriosos de sua estadia na antiga casa da família do marido; e os acontecimentos de 1635, contidos no diário de Anne Bainbridge, em que esta fora acusada de bruxaria.




Os capítulos, intercalados de acordo com as diferentes linhas temporais, dão à narração dinamismo e aguçam ainda mais a curiosidade do leitor. 


Alguns anacronismos me chamaram atenção na obra. Como a preocupação das personagens em não alterar a cena de morte de uma das personagens para a investigação policial --- preocupação que me parece ser moderna, e não ter existido em 1865; assim como a associação entre impressão digital e identidade de uma pessoa. São apenas pequenos detalhes passageiros que não prejudica em nada sua história, que segue o modelo gótico vitoriano, com a casa tendo uma função fundamental para a história, com seu clima misterioso, decadente, lembrando um passado glorioso que não existe mais, e um ambiente que, cada cômodo, invoca o passado da família com sua má influência sobre seus atuais moradores, sempre em meio ao nevoeiro e um inverno carregado  com muita neve e chuva. 


A escrita de Laura Purcell, rica em detalhes --- que para muitos poderá ser vista como cansativa ---, nos dá a sensação de passear pelos cômodos da casa. O que é maravilhoso. Porém faz com que a ação demore a acontecer, se arrastando muito, levando alguns a desistir da leitura e fazendo com que os elementos de terror fiquem bastante rarefeitos e percam sua força, já prejudicada devido muitos destes elementos serem previsíveis. A autora também não explica todos os acontecimentos da trama --- não explica, por exemplo, como e porque o esposo da protagonista morreu, nem o porquê das mortes de empregados e membros da família. O que para mim, não é um defeito, ao contrário, é bom deixar essa tarefa para o leitor; o que o torna ativo em relação a história.


Mas o que mais me chamou atenção no romance foi seu final --- um dos finais mais fracos, incipientes e anticlimáticos que já li. 


Porém, de modo geral, O Silêncio da Casa Fria é uma boa leitura, embora não entregue tudo que se propôs. 



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