O BAILE DOS VAMPIROS
Foi também no salão da condessa que conheci aquele que se tornaria um mestre e amigo, Sir Thomas Fields, esposo de Catherine e médico do rei, que me chamou atenção por se destoar dos demais vampiros por sua aparência.
A condessa, embora fosse dois mil anos mais velha do que ele, tinha aparência jovem, enquanto ele, era um decrépito ancião, opulento, que envelhecia por vontade própria. Dizia que a velhice trazia consigo certas vantagens, que eu só compreendi tempos depois. Quando me viu, logo reconheceu em mim alguém de sua espécie.
“Veja eles”, sussurrou ao meu ouvido. “Podes reconhecer quantos de nós estão aqui nesta sala agora?”, disse, enquanto olhava os convivas a dançar o sinuoso e encantador Minuetto de Boccherini. “Veja aquele rapaz, de cabelos amarrados por um gracioso laço de fita, que corteja graciosamente a bela jovem ao lado, de cujo pescoço ele não tira os olhos; será um vampiro?” A jovem de cabelos loiros, deixava à mostra uma apetitosa veia que se estendia do pescoço até a nuca, de onde suaves fios de cabelos dourados se desprendiam em cachos. “Como se pode saber sem que haja aqui um espelho, milorde?”, disse eu ao homem que olhava o salão com ar de deboche. Ao que retrucou: “Ora, assim como eu o reconheci, meu rapaz”.
Fiquei então a observar os casais, os pequenos grupos de jovens e aqueles que caminhavam ao redor do salão.
“Por julgar que ausência de reflexo em espelhos e por serem seres notívagos, sejam características de vampiro por demais óbvias, deduzo que os reconheça por outros meios. Então, confesso, milorde, que ainda não estou preparado para tanto”. Ele me respondeu: “Sim, é visível sua inexperiência, meu rapaz. Mas, venha cá comigo”.
E se pôs a andar pelo salão com sua bengala, vestido em seu jaquetão azul-celeste com botões de ouro e uma peruca empoada, salpicada de prata.
O casal citado anteriormente também saiu do recinto, caminhava à nossa frente. Ele então falou: “Devido ao prolongado tempo de vida, vampiros acumulam profundos conhecimentos e grande riqueza, por isso estão sempre entre os nobres e poderosos de qualquer país ou reino. Mas isso não é suficiente para identificá-los, já que todos aqui são ricos e poderosos, mas nem todos são vampiros. Contudo, vampiros são vaidosos. E se conheces alguém que seja vaidoso e que evite espelhos, certamente ali há um de nós. Mas há também outra forma de identificá-los. Passe-me aquele cálice de vinho e olhe meus olhos”. Fiz o que ele me pediu. Ele segurou o cálice de vinho contra a luz e logo vi seus olhos avermelhar-se ao olhar a taça, como se a cor do vinho se refletisse em seus olhos.
“Então o vinho faz seus olhos reagirem a ele”, exclamei. Ele me respondeu: “Não o vinho, mas a cor vermelha que desencadeia em nós o estímulo por sangue, revitalizando-nos. Não podes ver, mas também tens os olhos vermelhos”.
Naquele instante compreendi o porquê de eu, até àquele momento, ter sido poupado do contato com tal cor. Certamente para não me estimular ainda mais à busca pelo líquido precioso.
“Por isso, veja quantos estão a usar vermelho”, disse ele olhando os presentes. Reparei que a maioria usava tal cor, seja por meio de uma rosa nos cabelos, usado pelas damas, seja nos jaquetões dos cavalheiros ou nos lenços destes. Então, comentei: “Vejo, no entanto, milorde, que nada tens de vermelho”. Ele riu e disse: “Estás enganado, meu rapaz”. Então suspendeu as rendas de suas mangas expondo mãos descarnadas e amareladas, com os dedos repletos de anéis de rubi.
Finalmente, chegamos ao jardim e voltamos a ver o casal novamente, agora com a dama encostada a uma árvore e o rapaz em pé à sua frente.
“Olhe”, disse ele olhando em direção ao casal.
O rapaz abraçou a delicada dama e a beijou na face. E prestes a beijá-la nos lábios, ela se desvencilhou de sua boca, virou-se sobre seu pescoço e o mordeu com extrema voracidade, revirando os olhos vermelhos de prazer.
(Texto Tirado do Romance “Após a Chuva da Tarde - A Lenda de Camille Monfort: a Vampira da Amazônia”).
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