quarta-feira, 2 de abril de 2014

SEXO PERI-GOZO



Toda manhã uma bela mulher passava em frente ao prédio; era uma coroa alta, vistosa, daquelas de causar torcicolos nos que, ao virarem o rosto, acompanhavam com os olhos admirados, seu andar sexy, com pernas bem torneadas, ao dobrar a esquina vinda da quitanda ou do supermercado; deixando os homens maravilhados com seu rebolado de parar o trânsito.

E naquela manhã, antes da mulher passar novamente, Miranda se aproximou de Eurico, e lhe disse:
— E aí, como foi ontem com a coroa?
— Cara a mulher é um espetáculo, é mulher fina, muito bem cuidada: cheia de cremes para isso para aquilo e bem depilada.
Nesse momento Eurico puxou para baixo o colarinho, expondo o pescoço, e disse:
— Cheire aqui.
— Quê isso? Quê isso? — disse Miranda afastando-se. — Ô Eurico lá sou homem de ficar cheirando pescoço de outro!
— Sinta o perfume, é dela.
Miranda aproximou-se um pouco e sentiu de longe a agradável fragrância.
— Passado tanto tempo ainda estou com ele: é coisa fina e deve ser caro!
— E quanto ao sexo?
— Rapaz o melhor sexo da minha vida! A mulher, como eu disse, é um espetáculo, Miranda, que corpo deslumbrante; topa tudo com grande destreza: é uma safada na cama; e o melhor de tudo: é fácil fácil! Basta qualquer um assoviar pra ela para que o leve para cama.
— Qualquer um mesmo, Eurico?
— Ô Miranda tu me conheces, não sou do tipo de exagerar nas palavras; a mulher é uma ninfomaníaca, pergunte para qualquer um do almoxarifado; aliás, foi com eles que descobri isso; e daqui a pouco alguém de lá deve ser sorteado para tomar a vez de hoje — disse Eurico olhando o relógio.
— A vez de hoje?
— Sim, todo dia um é escolhido para desfrutar daquele monumento. A coroa, Miranda, é uma gulosa que jamais se contenta!
E após Eurico ver Miranda pensativo, disse:
— Porém, como sou teu amigo vou logo avisando: mas há um problema... — comentou Eurico frisando bem as palavras.
— Para ser tão fácil assim, sabia, tinha que ter um defeito... Não me diga que tem mau hálito!
— Não não não... Ô Miranda já não lhe disse que a mulher é muito bem cuidada? E tu me conheces, não sou do tipo de exagerar nas palavras.
— Então qual o problema?
— É que quem transa com ela faz sexo perigoso!
— Como assim sexo perigoso, Eurico?
Neste momento o telefone da firma toca, Eurico atende, interrompendo o diálogo com Miranda. E antes que possa responder do que se trata, Miranda parte antes do escolhido do dia chegar à esquina, onde a bela coroa passava todos os dias.
Miranda estava convencido de que o que Eurico chamava de sexo perigoso devia ser o gosto da mulher por transar sem camisinha. E ele estava disposto a participar desta roleta-russa sexual; para ele, pela coroa, valia apena correr todos os riscos. Mas algo não soava bem nessa história toda: se a mulher era alguém que se cuidava tão bem, jamais dispensaria uma boa camisinha, pensou consigo Miranda.
Três horas depois Miranda liga para Eurico, com a voz trêmula:
— Preciso que venha na delegacia com urgência.
Ao chegar à delegacia Eurico encontra Miranda atrás das grades:
— Preciso que me tire daqui logo, antes do banho dos presos. Já estão até me chamando de Carmen Miranda. Ô Eurico conto contigo, cara!
— Tudo bem tudo bem. E a coroa? Tudo ocorreu como previsto?
— Sim sim, eu assoviei pra ela, ela parou, me esperou e me disse para acompanhá-la até a casa. Lá fizemos tudo, tudo mesmo; a mulher, de fato, é uma devassa; mas, no bom, chegou o marido. Ô Eurico por que não me avisaste que era a mulher do delegado!
— Não avisei que a mulher gostava de sexo perigoso, Miranda? Pois então...
— Sexo perigoso, Eurico!
— Ora, e comer a mulher do delegado não é fazer sexo perigoso, homem?
— Tá bem tá bem...
— E o pior de tudo, Miranda, é que és um azarado mesmo.
— Por quê, Eurico?
 — Porque o marido já desconfiava, e tinha dito que o primeiro que fosse pego seria, por todos os presos, violentado.
— Ô Eurico tás de brincadeira comigo! — disse Miranda com os olhos arregalados.
E mais uma vez, Eurico repetiu uma de suas frases preferidas:
— Ô Miranda tu me conheces, não sou do tipo de exagerar nas palavras.
E no mesmo tempo que Miranda gritava por socorro, e os presos repetiam em coro “venha cá, minha Carmen Miranda”, Eurico deixava o amigo na cela no fim do corredor, sabendo que agora poderia desfrutar da companhia da bela mulher sossegado, seguro do marido achar que tinha pego o verdadeiro amante.

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