segunda-feira, 28 de abril de 2014

O GOZO DA SANTA



Poucas ideias tem um efeito tão contrário ao que se deseja quanto a ideia do proibido. Pois o ser humano parece ter um verdadeiro fascínio a tudo que é proibido: proíba um filme e ele será muito mais visto; proíba uma música e ela será muito mais ouvida; proíba um livro, uma comida, uma droga e eles serão muito mais lidos, comidos e consumidos etc. Em suma, proibir parece estimular ainda mais a curiosidade do que é proibido. E quando se proibi o que é natural no homem, o que não pode ser extinguido, como a sexualidade, então nem se fala... Ela ressurge de forma mais forte ou de forma sublimada ou, pior, distorcida.
E nenhuma atividade humana tem proibido mais o sexo do que a religião: dos padres e freiras celibatários, passando pela ideia do sexo tolerado somente como meio de procriação, à violência da Inquisição, que condenava à morte, da forma mais cruel e vexatória possível, aquele que praticasse formas de sexo não permitidas pela igreja.
Agora vejam esta imagem:


Trata-se da Santa Teresa d’Ávila, feita pelo escultor italiano Bernini (1598 - 1680), que retrata o momento em que a santa, em êxtase religioso, recebe a visitação de um anjo; nos diz ela:
“Vi na sua mão uma comprida lança de ouro, em cuja ponta de ferro havia um pequeno fogo. Ele parecia enfiá-la de vez em quando no meu coração, até perfurar minhas entranhas; e quando a puxava para fora arrastava tudo consigo, e me deixava em chamas, com um grande amor por Deus. A dor era tão grande que me fazia gemer; e no entanto era tão extraordinária a doçura dessa dor excessiva que eu não queria que ela parasse”.
Agora vejam esta outra imagem:


Ela retrata o detalhe do rosto de uma freira de um quadro do pintor alemão Heinrich Lossow, datado de 1880.
O leitor, certamente, irá notar certa semelhança entre estas duas imagens: ambas descrevem o êxtase através da expressão dos rostos de seus personagens. Porém, numa visão geral do quadro de Lossow, vemos o quanto tais obras são divergentes:



Mas seriam mesmo tão divergentes assim?
Sem dúvida alguma, há no quadro de Heinrich Lossow tanto erotismo quanto no relato da santa, que se assemelha de certa forma a uma relação sexual:
“Vi na sua mão uma comprida lança de ouro, em cuja ponta de ferro havia um pequeno fogo. Ele parecia enfiá-la de vez em quando no meu coração, até perfurar minhas entranhas; e quando a puxava para fora arrastava tudo consigo, e me deixava em chamas, com um grande amor por Deus. A dor era tão grande que me fazia gemer; e no entanto era tão extraordinária a doçura dessa dor excessiva que eu não queria que ela parasse”.
É quase que a descrição do gozo feminino. Seria uma sublimação do desejo do sexo?
Bernini soube muito bem descrever isso em imagem, não de modo tão direto quanto do diretor de cinema Nigel Wingrove no filme Visions of Ecstasy, que durante 19 minutos mostra as fantasias da santa espanhola Teresa d’Ávila com o Jesus crucificado. Em uma sequência de imagens, ela se contorce e acaricia o corpo de Jesus, que não reage. Em uma cena, a santa faz expressão de gozo.
E diferentemente da obra do escultor italiano, o filme foi proibido durante 24 anos pela censura britânica, sendo liberado apenas em 2012.
Abaixo cenas do filme:





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