quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

A RESSURREIÇÃO



ELES TÊM ME SEGUIDO DIA E NOITE em busca de informações sobre os mortos. E desde que os mortos retornaram à vida, há seis dias que não durmo a me rastejar pelas noites vazias, a fugir dos que me interpelam nas ruas, após o sumiço repentino e inexplicável de Joshua Nazareno, a quem um pequeno grupo de discípulos chamava-o de “Mestre”.
Não sei lhe dizer se tudo que aconteceu foi sonho ou realidade: tudo está tão confuso em minha memória, mas posso lhe dizer que eu estava lá quando tudo aquilo começou, aquela coisa horrível, que ainda hoje tremo só de pensar.
Joshua havia nos dito que, finalmente, iria nos revelar seu grande mistério em um jantar, onde seus doze discípulos participariam de tão grande segredo.
Naquela noite nos reunimos então como prometido. Estávamos todos sentados à mesa quando ele, no meio da távola, tomou um cálice vazio nas mãos, e disse:
“Hoje vos digo um mistério: Nem todos dormiremos, mas transformados seremos todos, num abrir e piscar de olhos. Nós seremos transformados. Pois é necessário que este corpo corruptível se revista de incorruptibilidade... E então se cumprirá a palavra que está escrito: Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?”.
Dito isto, pôs-se a cortar seus pulsos com a faca que estava sobre a mesa, colhendo o sangue no cálice vazio. E, após enchê-lo, disse a seus discípulos:
“Este é meu sangue, bebei-o em meu nome e da imortalidade. Esta é minha nova aliança que faço com vós”.
O cálice foi passado de boca em boca, e cada um tomou um gole de seu conteúdo. E após terem tomado de seu líquido, Joshua então nos disse: “Agora sou parte de cada um de vós”.
De imediato seus olhos ficaram vermelhos, seus dentes cresceram pontiagudos, em forma de presas. Joshua havia se transformado em uma fera com asas, que podia subir pelas paredes. Foi impossível não entrar em pânico do terror da fera que havia se instalado ao nosso lado. Contudo, foi inútil fugir, Joshua cravou seus espessos dentes em cada um de nossos pescoços.
Desse momento adiante, éramos filhos das trevas, criaturas noturnas, a espreitar pelas noites vazias, sedentos de sangue e de vida.  Foi quando ele nos disse:
“Após beberem do vinho da vida, comei agora o pão da eternidade, meus filhos; alimentai-vos de minha carne; devorai-me”.


E o devoramos... E hoje ele vive eternamente em cada um de nós.

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