quarta-feira, 10 de agosto de 2016

RELATO DO LEITOR: A Feiticeira


A FEITICEIRA
Naquele tempo — bem mais do que hoje —, ir de uma cidade a outra do interior do Pará era algo que exigia dificuldade, devido as suas inúmeras estradas de terra mal conservadas e transportes escassos. Por isso, naquela noite, eu e meu esposo, havíamos aproveitado um pequeno caminhão, que transportava alimentos, para irmos até a cidade onde morávamos. Lá chegando, paramos próximos a uma pequena ponte. E estando nós tomados pelo pó da estrada e pelo cheiro dos alimentos, resolvemos descermos a ponte e nos banharmos no pequeno rio antes de retomarmos o caminho de casa, a pé.
O silêncio reinava no lugar, interrompido apenas pelo vento que balançava os galhos das árvores e o doce som da água do rio deslocada por nossos corpos e pela nossa conversa. Conversávamos sobre os assuntos do dia a dia, enquanto nos banhávamos sob o luar, que mal conseguia clarear a imensa escuridão formada pelas inúmeras árvores ao redor. Foi quando um assobio alto e estridente fez-se ouvir da forma mais horripilante possível, que parecia vir do começo da ponte, acima de nós. Imediatamente nos silenciamos. Eu olhei para meu esposo, e pela expressão de seu rosto percebi que era ela... E temendo sermos surpreendidos por ela, nos vestimos logo. Em seguida seguimos em direção à ponte, do lado o posto ao assobio. E nos pusemos imediatamente a caminhar em direção a nossa casa, que ficava apenas a alguns metros dalí, sem olhar para trás. Foi quando ouvimos novamente o mesmo assobio acompanhado agora por passos estranhos atrás de nós; passos que não pareciam ser humanos.



Tomei meu marido sob meu braço e nos apressamos. Por sobre o ombro olhei para trás. Vi, em meio à escuridão, um animal enorme, que parecia um porco. Sim, ela havia se transformado em um horripilante porco, que estava parado a nos olhar de longe. Pus-me imediatamente a rezar, enquanto aquele animal horrível passou a caminhar em nossa direção, aumentando sua velocidade aos poucos, enquanto apressávamos ainda mais os passos. Até que, por fim, chegamos em casa. Cansados e assustados, fechamos imediatamente a porta. A criatura contornou a casa. Chocou-se contra a porta, a janela. Seguiu para o quintal, produzindo neste um som estrondoso. Depois tudo ficou em silêncio. Ouvíamos apenas nossas respirações ofegantes. Foi quando ouvimos, ao longe, novamente o assobio estridente. A matinta perêra havia desistido de nós.
*História escrita pelo administrador do blog BORNAL, contada e testemunhada por seus pais.


A Matinta Perêra é uma personagem de histórias testemunhadas por moradores da região norte. Diz-se ser uma mulher que, por maldição herdada de família, ou pelo poder da feitiçaria, transforma-se em um pássaro agourento (e em outros animais) que pousa sobre os muros e telhados das casas e se põe a assobiar e só para quando o morador, já muito enfurecido pelo estridente assobio, lhe promete algo para que pare (geralmente tabaco, mas também pode ser café, cachaça ou peixe). No dia seguinte a velha vem até a casa do morador perturbado para cobrar o combinado, caso o prometido seja negado uma desgraça acontece na casa do que fez a promessa não cumprida. (Tirado, em parte, da Wikipédia).

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