O MISTÉRIO DA MÚMIA ENCONTRADA NO PÃO DE AÇÚCAR
Bem
antes da cidade do Rio de Janeiro se tornar famosa pela violência de suas
favelas e pela desova de cadáveres, há 69 anos, um grupo de amigos se reúne para
escalar o famoso Pão de Açúcar. Porém, o que seria um dia de conquista para se
recordar, acabou se tornando um dia sinistro digno de um bom filme de terror
após terem achado um corpo humano misteriosamente mumificado.
O
mistério teve início na manhã de 19 de setembro de 1949. Lá pelas sete da
manhã, cinco amigos - Antônio Marcos de Oliveira, Laércio Martins, Patrick
White, Ricardo Menescal e Tadeusz Hollup - se encontram na Praça General
Tibúrcio, na Praia Vermelha, Rio de Janeiro, para escalar o Pão de Açúcar.
Não
era uma escalada como outra qualquer. Em vez de simplesmente subir o paredão de
396 metros de altura por uma das três vias de acesso já desbravadas, os
montanhistas, membros do Clube Excursionista Carioca (CEC), decidiram explorar
uma quarta trilha, ainda mais perigosa e arrojada que as anteriores.
Ainda
na clareira que dá acesso ao paredão, Hollup, então com 19 anos, começou a
desconfiar de que algo estava errado quando viu um sapato de mulher,
deteriorado pelo tempo, em plena Mata Atlântica.
"Será
que, daqui a pouco, vamos encontrar a dona do sapato?", perguntou ele, em
tom de brincadeira.
"Mesmo
assim, não dei muita importância. Joguei o sapato fora e continuamos a
subir", explicou em sua última entrevista, dada ao programa Esporte
Espetacular, da TV Globo, em 22 de outubro de 2017.
Tadeusz
Hollup, o último dos desbravadores da chaminé Gallotti, morreu no dia 27 de
agosto de 2018, aos 88 anos.
Havia
um cadáver no meio da escalada
Alguns
metros acima, Oliveira, o caçula do grupo, com 18 anos, já desbravava a encosta
do morro. Dali a pouco, por volta das 11h30, se deparou com um cadáver, preso
pela garganta, numa fenda estreita da rocha, apelidada de "chaminé"
pelos alpinistas.
Ao
contrário do que se poderia imaginar, o defunto não estava em estado de
putrefação e, sim, "mumificado".
"Quando
o vento bateu mais forte, o cabelo dele, que era enorme, pousou no meu ombro.
Foi aí que vi que era uma pessoa. Fiquei apavorado!", relatou Oliveira no
documentário Cinquentona Gallotti (2004), escrito e dirigido por Priscilla
Botto e Paulo de Barros.
Na
mesma hora, berrou para os amigos: "Ó, tem uma pessoa morta aqui!".
Hollup
e Menescal caíram na gargalhada. "Que história é essa?", quis saber
Hollup, aos risos.
"Achou
a dona do sapato?", fez graça Menescal. Os dois levaram na brincadeira.
Mas Oliveira, não. Quando chegaram ao local, tomaram um susto daqueles. A coisa
era séria mesmo.
Diante
da "descoberta" macabra, os amigos resolveram suspender a escalada e
avisar a polícia. A tão sonhada conquista da chaminé Gallotti - proeza
alcançada só cinco anos depois, em 1954 - teria que ficar para outro dia.
Na
manhã seguinte, os cinco voltaram à Urca, acompanhados de policiais, repórteres
e legistas. Munidos de grampos, martelos e brocas, desceram o corpo da
"múmia" até a clareira, onde estavam os bombeiros. Naquela época, os
escaladores usavam cordas de sisal e coturnos com tachas. Tudo muito rudimentar
para os padrões atuais.
A
"descoberta" da múmia virou notícia em todos os jornais. Para espanto
geral, o laudo, assinado pelo médico-legista José Seve Neto, desfez o
mal-entendido: o cadáver não era de mulher, como imaginado inicialmente por
causa da vasta cabeleira, mas de um homem.
Segundo
a nota publicada na edição do dia 20 de setembro de 1949, do jornal O Globo, os
restos mortais pertenciam a "indivíduo de cor branca, com 35 anos
presumíveis, de 'compleixão' (sic) franzina e com 1,60 m de altura".
Ainda
de acordo com o laudo, o defunto, que vestia um suéter e uma camisa sem mangas
de algodão, não apresentava sinais de fratura, nem vestígio de bala ou facada.
E o pior: não trazia documentos.
"Os
legistas concluíram que o cadáver estava lá havia uns seis meses, pelo
menos", relata Oliveira.
"Foi
mumificado devido à maresia."
O
químico Emiliano Chemello, da Universidade de Caxias do Sul (UCS), explica que
a maresia pode ter ajudado, sim, na mumificação do cadáver. Isso porque o sal presente
nela absorve a água, retardando processo de decomposição do corpo.
"Os
antigos egípcios usavam um minério chamado natrão, rico em carbonato de sódio.
Eles empacotavam o natrão, em pequenas bolsas, dentro do corpo da múmia, além
de jogarem um punhado do minério sobre o cadáver. Quarenta dias depois, o
defunto estava encolhido e duro", diz.
Que
fim levou a 'múmia' carioca?
Apesar
de toda a repercussão nos jornais da época, nenhum amigo, parente ou familiar
apareceu no Instituto Médico Legal (IML) para reconhecer o corpo. De quem era o
cadáver encontrado na chaminé Gallotti? Ninguém sabe. A identidade da
"múmia", sete décadas depois, continua ignorada.
Mas
essa é apenas uma das muitas perguntas sem resposta. Outra: como foi parar lá?
Há várias hipóteses: de suicídio a assassinato. Para o extinto jornal A Noite,
um dos muitos a cobrir o caso, os restos mortais pertenciam a um mendigo que
teria se jogado morro abaixo.
Rodolfo
Campos, roteirista e diretor do curta A Múmia da Gallotti (2009), tem outra
versão: "Por ser um homem vestido de mulher e ter os cabelos compridos,
suspeito que fosse um travesti que, talvez, estivesse fugindo de alguém ou
tentando se esconder na mata. Mas é impossível afirmar com certeza".
Será
que, no fim das contas, o mistério da "múmia" carioca esconde um caso
de transfobia?
"Em
1968, os militares ordenaram a saída dos três e hoje, na caverna, vivem apenas
morcegos", arremata o historiador.
Outra
pergunta intrigante: que fim levou a "múmia" do Pão de Açúcar? Tudo
indica que, a exemplo das peças egípcias que faziam parte do acervo de 20
milhões de itens do Museu Nacional, teve destino trágico. A diferença é que, em
vez de ter sido consumida pelas chamas de um incêndio, teria sido sepultada
como indigente por falta de documentação e reconhecimento familiar.
* Tirado do Site da Uol: O mistério da múmia da Gallotti, que Intriga Estudiosos, Quase 70 Anos Após Ser Achada no Pão de Açúcar
* Tirado do Site da Uol: O mistério da múmia da Gallotti, que Intriga Estudiosos, Quase 70 Anos Após Ser Achada no Pão de Açúcar
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