quinta-feira, 26 de julho de 2012

DOIS HOMENS, DUAS MORTES E UMA TERRÍVEL OBSESSÃO (de Bosco Silva)

By James Ensor

...tudo no mundo perde o sentido, quando seu corpo tornar-se azul e os seus olhos perderem o brilho.
Pedro Don Bosco (retirado de seu livro: Poesias Para O Final dos Tempos, de 1904).

13 DE SETEMBRO DE 1874. Um dia que uniria duas vidas trágicas, uma fadada ao sucesso, outra ao mais absoluto esquecimento, mas todas ligadas por uma estranha obsessão.

Em Viena, Áustria, nasce Arnold Schoenberg (1874 – 1951), famoso compositor, um dos responsáveis pela moderna música erudita, com sua biografia obrigatoriamente estampada em enciclopédias ou em livros sobre história da música. E no mesmo momento, no Brasil, nasce Pedro Don Bosco (1874 – 1904), o obscuro poeta das amarguras, poeta de coração e mente apenas lembrado por minha falecida avó, sua única neta.

DUAS VIDAS, UM SÓ DESTINO

SCHOENBERG

Filho de judeus, Schoenberg desde cedo se sentiu atraído pela música. Com oito anos de idade passou a compor suas primeiras músicas, estimulado por um tio. Foi também nessa época que Arnold começou sentir-se atraído por um estranho fascínio pelos números. Este fascínio acompanhou-o por toda a vida, e enquanto crescia passou acreditar que por meio dos números era capaz de adivinhar o próprio destino.

Schoenberg acreditava que nos números estava a chave de seu futuro, principalmente o dia de sua morte. E como este havia nascido em um dia 13, passou a cismar que este número estava terrivelmente ligado ao dia de sua morte. Então passou a combinar todos os números menores de dez que somados daria 13. E assim algo lhe levou misteriosamente a achar que morreria aos 76 (7+6=13) anos de vida.

Foi com extrema angustia que Arnold via se aproximar a cada ano o ano que faria 76 anos. E quando o fatídico ano chegou, Schoenberg estremeceu a cada dia treze daquele ano; porém um lhe foi especial, e lhe encheu de horror, ao ver no calendário que o dia 13 de junho cairia numa sexta-feira. Isto lhe deixou horrorizado por vários dias; e quando finalmente o dia começou, Schoenberg, relutou em sair da cama, queria evitar algo imprevisto, não daria nenhuma chance para a morte. E assim passou aquelas malditas horas. Contudo, quando faltavam poucos minutos para o término do dia, sua mulher, que não acreditava em suas teimosias, foi-lhe avisar de seu erro; encontrou-o ainda deitado. Arnold Schoenberg abriu os olhos, disse-lhe apenas “harmonia” e faleceu misteriosamente em silêncio. Ao olhar para o relógio do quarto, sua mulher verificou que era ainda 11:47, faltavam 13 minutos para a meia-noite. E assim morreu Schoenberg no dia 13 de junho, aos 76 anos, em uma sexta-feira 13.

FONTE: Wikipédia

PEDRO DON BOSCO

Pedro Don Bosco nasceu em uma pequena cidade afastada de Belém, pelas mãos de uma velha parteira, como mais tarde se referiria o poeta ao seu nascimento:

Nasci numa noite escura, sob luz de velas, nas mãos de uma velha parteira, de olhos abertos à procura da luz.

E enquanto, na Europa, Schoenberg se dedicava a suas primeiras composições, e crescia impressionado com o poder dos números, em Belém, Pará, o poeta iniciava-se em seus primeiros rudimentos de escrita; e com prodigioso talento já imprimia no papel belas frases oriundas de seu “pequeno coração atormentado e aflito”.

O poeta bem sabia de seu destino: nascera com o estranho desejo de luz e conhecimento. E assim como Schoenberg, crescia-lhe também o sentimento trágico da vida. Sua mãe havia morrido ao dar-lhe a luz, o que lhe causava um imenso sentimento de culpa. Culpa que lhe acompanharia por toda vida e que aumentaria quando este, ainda jovem, foi imprevistamente substituído, na última hora, por um amigo em uma viagem de navio, que lhe causou enorme angústia quando soube que o navio naufragara e que todos haviam morrido, incluído tão amado amigo. Havia naquilo algo de misterioso, que o poeta tentava a todo custo desvendar: era como se duas pessoas houvessem morrido para que o poeta se mantivesse vivo e compusesse suas tristes odes; que se alimentavam de cada lágrima caída. Pedro Don Bosco era poeta por maldição, bem sabia ele.

Numa noite, após casar-se, o poeta, acompanhado de sua querida esposa, havia ido a um maravilhoso baile. Os casais dançavam, rodopiavam, alegremente, pelo enorme salão, iluminado por um imenso lustre de prata. E ao término de mais uma série de músicas, um homem subiu ao palco, anunciou uma nova atração, madame Fifi, a maravilhosa vidente, vinda diretamente de Paris. Todos enfileiraram-se para terem suas mãos lidas por tão famosa vidente. Porém, Bosco se mantinha impassível, não acreditava em tais tolices. E após todos terem suas mãos lidas, o poeta foi estimulado pelos amigos a por suas crenças à prova, foi levado então por aqueles a estender sua mão à vidente. Ela tomou-a entre as mãos; olhou atenciosamente suas linhas, e com certo espanto no rosto disse-lhe, firmemente: “Devolverás o que não lhe pertence. E com água devolverás a vida”. Aquelas palavras afetaram-lhe grandemente, e fez-lhe vir à mente memórias indesejadas: pensou então em sua mãe e em seu amigo, e nas vidas que havia roubado destes, antes que assustado puxasse sua mão à força. Sua mulher não compreendeu tão brusco ato, e disse-lhe em tom de gracejo: “sabia que és no fundo um supersticioso, Pedro Don?”.

Durante anos a voz da vidente se repetiria em sua mente: “Devolverás o que não lhe pertence. E com água devolverás a vida”. Tanto que durante meses havia tido pesadelos com tal frase, finalizados com terríveis naufrágios.

Temendo que o sonho torna-se realidade, e por fim acabasse afogado, evitou a todo custo rios e mares. E como sua mãe havia lhe dado a vida em um dia treze, imaginou também que em um dia treze perderia a vida. Porém um dia foi avisado que sua mulher havia entrado em trabalho de parto e que precisava com urgência de um médico. Desorientado, buscou um, e foi lhe indicado partir a barco. Ao que relutou. E após mandar o médico a barco, partiu de volta à cavalo. Cavalgou durante horas a fio, sob a mais espessa chuva, tendo apenas como companhia o cavalo, nem mesmo a lua e as estrelas serviam-lhe de companhia. Porém ao amanhecer ainda não havia chegado. Passaram as horas até que finalmente seu corpo foi encontrado, caído, de bruços, com o rosto sobre uma poça d’água que havia se formado sob as patas do cavalo. O poeta havia incrivelmente morrido afogado em tão pequeno lago, no dia 13 de maio de 1904. Deixando maravilhosas páginas amareladas pelo tempo.

Duas vidas dedicadas a arte e a uma terrível obsessão ao número 13.

Dedicado à memória de minha tataravó Catarina Don Bosco, que também nasceu de olhos abertos, naquela fatídica noite, à espreita da luz, mas isso é outra história...
   

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