BARBEIROS EXISTEM?
Um homem foi ao cabeleireiro para
cortar o cabelo (óbvio). Para quebrar o gelo, ele começou a conversar com o
profissional de cabelos oxigenados. Conversa vem, conversa vai, até que
começaram a conversar sobre Deus... Ouve uma pequena discussão:
- Eu não acredito que Deus
exista, como você fala - disse o barbeiro.
- Por que você diz isto? -
perguntou o cliente.
- Bem, é muito simples: você só
precisa sair na rua para ver que Deus não existe. Pô, se Deus realmente
existisse, você acha que existiriam tantas pessoas doentes? Existiriam crianças
abandonadas? Existiriam usuários de drogas? Se Deus existisse, não haveria
sofrimento. Eu não consigo imaginar um Deus que permite todas essas coisas.
O cliente pensou por um momento,
mas resolveu não prolongar a conversa. O barbeiro terminou o seu trabalho e o
cliente saiu do estabelecimento. Neste momento ele viu um homem sentado na
calçada com barba e cabelos longos e desgrenhados. Parecia que fazia um bom
tempo que aquele homem não cortava os cabelos ou fazia a barba, além de estar
completamente sujo. O cliente retornou ao cabeleireiro e disse ao barbeiro:
- Sabe de uma coisa? Barbeiros
não existem.
- Oras, como não existem? - disse
o barbeiro confuso. - Eu estou aqui na sua frente. Não sou um barbeiro?
- Não! - exclamou o cliente com
um brilho diferente nos olhos. - Eles não existem, porque se existissem, não
existiriam pessoas com barba e cabelos longos, sujos e desgrenhados como os
daquele mendigo.
- Ah, mas barbeiros existem, o
que acontece é que as pessoas não me procuram e isso é uma opção delas.
- Exatamente! - afirmou o
cliente. - É justamente isso. Deus existe, o que acontece é que as pessoas não
o procuram, pois é uma opção delas, e é por isso que há tanta dor e sofrimento
no mundo.
COMENTÁRIO:
A questão de acreditar em algo
somente pelo fato de trazer algum conforto é sem dúvida bastante sedutor para
muitos, porém para outros, como eu, a coerência é fundamental e existe como uma
exigência independente de minha vontade, pois sendo eu um ser racional é
natural que esta parcela de mim se manifeste, até mesmo quando vejo o mais
fantasioso filme; e mesmo sabendo que tudo é mentira, o meu lado racional me
cutuca, quando vejo uma cena que é extremamente absurda, como dizendo: “veja,
isso é de mais para mim, já estão subestimando minha inteligência”, mesmo em
uma obra de ficção; creio também que isso deve acontecer com a maioria, apenas
possuem esse lado racional menos ativo. E o grande problema de se ser seduzido
apenas por aquilo que nos traz conforto, é que em nome deste consolo, muitas
vezes perdemos facilmente nosso senso crítico e tornamos presas fáceis de
embustes e enganações.
O mesmo acontece com essas
fórmulas simples de se lidar com a questão: Deus; pois a história acima se baseia
no seguinte raciocínio:
A afirmação (A): “Se há mal e sofrimento no mundo, não há Deus” é
comparada a afirmação (B):“se há pessoas cabeludas e barbudas, não há barbeiros”;
porém se é verdade que há pessoas cabeludas e barbudas no mundo, e há barbeiros,
então, por comparação, a afirmação (A),
sobre Deus, está errada também, já que assim como a existência de pessoas
cabeludas e barbudas não implica na não-existência de barbeiros, a existência
do mal e do sofrimento no mundo não implica também na não-existência de Deus, logo, por comparação, existe, sim, Deus.
É obvio que sua simplicidade é
logo de cara um grande atrativo, e que também seduz por sua forma poética, mas
o problema é que esta simplicidade não trata a questão como deve ser tratada,
pois as afirmações (A) e (B) não são de modo algum semelhantes, EXIGÊNCIA IMPRESCINDÍVEL para que a história
tenha coerência, pois todos irão concordar comigo que existe infinita diferenças
entre um barbeiro e Deus; que também há uma enorme diferença em como chegamos à
ideia de Deus e de um barbeiro: a ideia de Deus (ser infinito, infinitamente
bondoso, todo-poderoso, infinitamente sábio, etc.) alcançamos por meio de uma
religião (entre milhares de religiões, com deuses de todos os tipos) enquanto a
simples ideia de barbeiro chegamos à ela por meio da experiência direta; o
barbeiro, é um ser finito, enquanto Deus é um ser infinito, e etc.
Além disso, podemos conceber, sem
nenhum problema, pessoas que queiram usar cabelos e barbas longas, sendo por
isso independentes de barbeiros, mas não podemos conceber que o mundo possa
escolher ser ou não criado por um Deus, ou melhor, ser independente de um Deus.
Portanto, A HISTÓRIA É FALHA E ENGANOSA,
já que a base dela é comparar, equiparar, o barbeiro a Deus, afirmando que o
mesmo efeito possui causas similares, levando-nos a entendermos, sem dúvida de
modo intencional, que o que cabe a um cabe a outro: se o barbeiro existe
independente de haver ou não pessoas barbudas e cabeludas, então Deus também
existe independente de haver ou não o mal e o sofrimento no mundo; mas vimos
que há infinitas diferenças entre um e outro, o que é permitido a um não é a
outro; ademais, sendo o barbeiro finito e simples e conhecendo sua existência
diretamente, torna-se muito mais provável a existência de um barbeiro do que de
um Deus com toda sua complexidade. Além disso, a história depende de Deus ser
de fato bom, o que deveria ser demonstrado antes.
MORAL DA HISTÓRIA: no fundo a comparação entre Deus e o barbeiro,
além de ser erronia, é ofensiva a Deus, já que não apenas iguala Deus ao
barbeiro, como aqueles que vão até ao barbeiro, para terem os cabelos e as
barbas cortadas, vão somente mediante pagamento (POR ISSO QUE EXISTEM MENDIGOS
BARBUDOS E CABELUDOS); o que contradiz com a ideia de um Deus bonzinho,
consolador e auxiliador, preocupado com suas criaturas.
FONTE: CEREBRAU.COM.BR: UM
SITE DE FILOSOFIA E LITERATURA DE TERROR.
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