OS LIMITES DOS SENTIDOS E O SOBRENATURAL
Como
já foi dito em um artigo anterior, O Mundo dos Mortos e a Literatura de Terror, alguns escritores de Literatura de Terror levaram
para suas obras literárias concepções ocultistas e conhecimentos mágicos. Escritores
como Algernom Blackwood, Arthur Marchen, que tinham como tema frequente de suas
obras o contato com o oculto, com "a parte escondida da realidade",
pertenceram a sociedades de magia, como a Golden Dawn, frequentada também pelo
famoso bruxo Aleister Crowley, antes deste criar sua própria escola esotérica,
a A. A., e nela estes autores galgaram os mais altos postos de conhecimentos
esotéricos.
E
já que estamos falando de escritores associados a magia, um fato curioso é
contado na biografia do escritor Paulo Coelho, conhecido por participar no
passado de sociedades esotéricas. Quando este se interessou pela obra de
Aleister Crowley, o que o levou a entrar para a ordem esotérica do bruxo inglês,
ele, sem dominar ainda profundos conhecimentos esotéricos, decidiu invocar uma
entidade, segundo os rituais daquela sociedade esotérica. O resultado foi que a
coisa apareceu mesmo para ele. E não apenas para ele, apareceu também
simultaneamente, porém em lugares diferentes, para sua esposa, e para uma amiga
do casal, que também tinha se iniciado na A. A., de Crowley.
O
livro nos conta que a experiência foi tão terrivelmente traumática para Paulo,
que ele largou a sociedade. E após o incidente ele ainda ouviu do mestre
supremo da A. A., da época, um esporro: “A Thelema é a lei do forte. É para o
forte. É para quem aguenta. Quem não aguenta, se fode. Não é coisa para
crianças”.
Mas
voltando ao texto. Para este novo artigo, teremos a questão “Se o sobrenatural
existe, por que não podemos provar sua existência?” como tema. Tentaremos
responder a questão por meio de uma resenha do conto Carta de um Louco de outro grande autor de Literatura de Terror, o
francês Guy de Maupassant, em que o narrador, duvidando de seus sentidos, tenta
demonstrar a existência do sobrenatural. E embora Guy de Maupassant não tenha
participado, pelo menos que se saiba, de nenhuma sociedade esotérica, explorava
o terror em seus contos por meio de análises psicológica e filosóficas da noção
de medo provocado pelo desconhecido, daquilo que não podemos ver com clareza,
mas apenas antever com terror, sem poder se proteger dele.
SOBRENATURAL, O CONCEITO
Antes,
porém, torna-se necessário esclarecer o que se entende por SOBRENATURAL.
Sobrenatural
é tudo aquilo em que as leis da natureza, da matéria, não se aplica; é o que
não pode ser explicado pelas leis da matéria. Sendo assim, ideias como alma,
magia, possessão, anjos, demônios, deus, milagres etc., são tidos como fenômenos
sobrenaturais, pois suas origens, seus comportamentos, seus modos de existência,
não poderia ser explicado pelas leis da matéria.
Portanto,
não confundir o conceito de sobrenatural com aquilo que não podemos ainda
explicar pelas leis da matéria por falta de melhor conhecimento destas leis.
Exemplo: Há cem anos atrás telefones celulares seriam vistos como algo
sobrenatural, embora hoje sejam bem explicado pelas leis da física.
OS LIMITES DOS SENTIDOS E O
SOBRENATURAL
No
conto Cartas de um Louco, de Guy de
Maupassant, o narrador, tenta convencer seu médico de que não está louco; para
isso lhe escreve uma carta tentando lhe convencer de que existe, sim, uma
criatura sobrenatural, invisível, que o persegue, e drena sua energia, aos
poucos, não sendo fruto de uma loucura qualquer sua. Para tanto, ele começa
argumentando que são os nossos sentidos a fonte de nosso conhecimento do mundo
exterior, servindo de intermediário entre nós e as coisas deste. Passando, em
seguida, a examinar nossos sentidos, e descobrindo nestes imperfeições e
falhas, gerando, por sua vez, falhas também nos nossos conhecimentos do mundo
exterior, obtidos por meio deles. Por fim, conclui que o fato de algo não poder
ser captado por algum de nossos cinco sentidos, não significa que este algo não
exista, mas apenas que não podemos concebê-lo.
“Se
tivéssemos, portanto, alguns órgãos a menos, ignoraríamos coisas admiráveis e
singulares, mas, se tivéssemos alguns órgãos a mais, descobriríamos em torno de
nós uma infinidade de outras coisas de que nunca suspeitaremos por falta de
meios de constatá-las”.
Como
acontece com os cegos e as cores. Um cego de nascença, sem o sentido da visão,
jamais poderá conceber o que são as cores, e o quanto são belas; porém, isso
não as impedi que existam, sendo comprovadas por aqueles que enxergam. De modo
que, usando esse mesmo raciocínio, podemos conceber que possa existir algo que
não temos conhecimento, o que não impede que exista. Isso leva a ideia de que
pode existir muitas coisas ao nosso redor, que não temos conhecimento algum,
simplesmente por não termos nenhum sentido apropriado para poder percebê-las.
Este raciocínio, o narrador do conto aplica a estranha criatura que o persegue,
como forma de demonstrar a possibilidade de sua existência, mas também podemos aplicar,
de modo geral, a tudo aquilo que engloba o conceito de sobrenatural. Podendo
existir mundos tão diferente do nosso, com criaturas tão diferentes das
criaturas do nosso mundo, mas que não temos conhecimento de sua existência,
simplesmente por não termos sentidos capazes de captá-los e compreendê-los.
“E
esse terror confuso do sobrenatural que habita o homem desde o nascimento do
mundo é legítimo, pois não é outra coisa senão aquilo que nos permanece oculto”.
(Cartas de um Louco).
Portanto,
o narrador não prova que o mundo sobrenatural exista, mas demonstra que a
existência deste é possível.
MÁQUINAS QUE AGUÇAM NOSSOS
SENTIDOS
Muitos
poderão se contrapor ao argumento anterior dizendo:
Embora
nossos sentidos sejam limitados e falhos, nossa inteligência pode criar
aparelhos capazes de aguçá-los e reparar suas falhas, ou até mesmo captar
coisas que nossos sentidos não são capazes de perceber - como energia
magnética, nuclear, gazes sem cheiro, etc. De modo que, por meio deles, podemos
dizer o que existe e o que não existe das coisas que estão ao nosso redor.
A
nossa inteligência é capaz, sim, de por meio de aparelhos e outros artifícios,
reparar as falhas de nossos sentidos e de aumentar muito nossa percepção e
conhecimento do mundo em que vivemos. Porém, sempre teremos em mente a ideia de
que nem tudo ainda foi inventado capaz de esgotar a possibilidade de que exista
algo que ainda não conhecemos. E também de que os aparelhos que inventamos só
são capazes de captar o que é material ou energias que podem interagir com a
matéria. De forma que algo que não seja material ou que não interage com a
matéria não poderá ser captado por nossas máquinas. Fato que, como foi visto
anteriormente, não exclui de vez a possibilidade que exista este algo. O que
faz surgir a pergunta:
Se
os fenômenos sobrenaturais são imateriais, como podem ser percebidos?
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