INTRODUÇÃO
À MAGIA SEXUAL: SEXO E PAGANISMO
Houve
uma época em que o homem não era visto como um ser à parte da natureza, mas sim
mantendo uma profunda e insolúvel harmonia com esta; fazendo tanto parte desta
quanto os leões, os carvalhos, ou mesmo os minerais; era uma época que ainda
não se tinha inventado o pecado, e que o sexo não era visto como algo
pecaminoso, mas divino, um dom da natureza ou um caminho que levava aos deuses:
um meio de conhecimento e iluminação pessoal, capaz de mostrar ao homem uma
parte então desconhecida de si próprio: sua identidade profunda com a natureza,
com suas forças fundamentais.
Foi
a época das religiões panteístas que concebiam Deus, não como um ser agindo
fora do mundo, mas de dentro do mesmo, um ser imanente ao mundo; e também dos
grandes cultos a Afrodite, com suas sacerdotisas que em seus templos copulavam
com os devotos da grande deusa; das bacantes, que por meio do vinho, e em nome
do deus Baco, embriagavam os homens e os levavam a serem absorvidos por seus
instintos sexuais, copulando com estes durante o culto de seu deus nos campos,
bosques e prados; e do deus Príapo com seu grande falo, o deus da fertilidade,
responsável pela fertilização dos animais e vegetais. Enfim, era uma época em
que o sexo era tão sagrado quanto as religiões, e em que o sagrado feminino
dominava o mundo, onde não se rejeitava nossa animalidade, nossos instintos.
E
foi, certamente, a partir do momento em que o homem se sentiu como um ser
superior e independente da natureza; um ser feito, erroneamente, à imagem de um
deus, que assim como este, transcenderia a natureza, que se viu dividido entre
dois mundos, um natural, governado pelas leis naturais do corpo e o outro,
sobrenatural, comandado por leis superiores, imateriais, que não pertenceriam
ao nosso mundo, que nos levou a renegar nossa origem animal, como algo inferior
e impróprio do homem, um arcabouço de sentimentos bestiais e bárbaros - mas
devemos lembrar que os mais baixos sentimentos humanos não pertencem aos
animais. Disso surgiram a moral e as proibições religiosas ao sexo, e a ideia
de que devemos privilegiar nosso lado transcendente em detrimento de nosso lado
animal. Não admira, portanto, que o sexo como aquilo que mais uniria os homens
aos outros animais tenha sofrido tanto com esta forma de pensar,
transformando-se em algo indigno do homem.
Por meio de Eva (primeira mulher), Adão (o primeiro homem) come o fruto Proibido e juntos Descobrem o Pecado e a Vergonha de seus Corpos Nus, e são Expulsos por Deus do Paraíso |
Porém
tal pensamento não deixou de ter consequências terríveis para a humanidade,
gerando as perseguições religiosas e tornando as mulheres suas maiores vítimas,
como na Inquisição católica; e a Inquisição foi a conclusão da longa história
de preconceitos, de repressão, de intolerância, ao sexo, a mulher, enfim, ao
diferente. E a mesma mulher que provocou a expulsão do homem do paraíso ainda
era uma ameaça presente, com sua natureza diferente, com seu sexo que atraia a
natureza reprimida dos homens “santos”, gerando mortes aos milhares.
A Inquisição Católica foi a Conclusão da Terrível Ideia de Pecado, da Inferiorização da Mulher e da Deturpação da Natureza Humana |
O
afastamento do homem da natureza trouxe-lhe também certa sensação de abandono e
de incompletude ou gerando doses desnecessárias de sofrimento psicológico em
forma de terríveis e desnecessário sentimento de culpa ao mesmo, já que sendo o
homem uma parte da natureza - e como a parte só tem sentido quando vista em seu
todo - o afastamento do homem da natureza, não o deixaria ver-se como parte de
um grande todo, de um grande “plano”, gerando-lhe sensação de abandono e
incompletude. Não admira, por isso, que após afastarem o homem da natureza,
muitos religiosos digam que lhes falta algo, como um deus ou algo parecido.
E
assim a mais de dois mil anos nos ensinam a termos vergonha de nossos corpos, a
odiarmos o que nós próprios somos, a termos vergonha de nossa própria natureza.
Nossa moral e religião nos ensinam a associar rigor sexual à dignidade e
liberdade, a não acatarmos os desejos do corpo, a mortificá-lo para não sermos
escravos do mesmo, de seus apetites e desejos; o homem soberano, para esta
forma de pensar, não se deixa levar por seus impulsos e instintos.
Contudo,
por trás de tal concepção se esconde uma luta ferrenha e doentia entre cada
indivíduo consigo próprio: uma luta entre os impulsos mais naturais do homem e
o desejo inútil de abafá-los, de calá-los; gerando assim sentimentos de culpa
desnecessários ou no mais das vezes gerando o efeito contrário, já que tudo que
é proibido tende a ser muito mais procurado, estimulando, assim, o que
justamente tentam limitar. E sendo a transgressão e o sadismo elementos
inerentes a sexualidade, o proibido tende não apenas a estimulá-los como
distorcer o sexo, gerando por meio do sadismo e da transgressão comportamentos
sexuais destrutíveis. E onde há culpa, há também castigo. Não admira por isso
que as igrejas estejam abarrotadas de pessoas obcecadas com os sentimentos de
culpa e de pecado, já que aprendem desde que nascem a identificarem em todas as
coisas naturais expressões de pensamentos pecaminosos.
Todavia,
por meio da FILOSOFIA DO ORGASMO demonstraremos por meio dos próximos artigos
que, ao contrário do que nos é imposto, o homem verdadeiramente livre é aquele
que segue a natureza, que não luta consigo próprio, contra sua própria
natureza; não é alguém dividido entre o que se é e o desejo de negar a si
próprio; enfim, ser livre jamais implica em renúncias, mas ao contrário, o
verdadeiro escravo é aquele que ao reprimir seus impulsos naturais torna-se
carrasco de si mesmo. Em suma, o presente trabalho, tenta, como no passado, harmonizar
o homem à natureza por meio do sexo, tido como um meio de autoconhecimento, e
ao harmonizar o homem com a natureza, harmoniza-o também consigo próprio, com
que verdadeiramente somos.
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