terça-feira, 1 de março de 2016

CONTO: A CASA DA NOITE ETERNA



A CASA DA NOITE ETERNA
Havia muitos anos que o conde de Esterházy não visitava o velho casarão de sua família, em que nascera e passara grande parte de sua infância. E com o passar dos anos, a vontade de revê-lo por uma última vez antes de morrer tornava-se cada vez mais intensa. Ele tinha a profunda convicção de que necessitava respirar seus ares antes de deixar esse mundo. Talvez por um sinal de que sua vida havia se aproximado de seu fim, escolhendo fazer da velha casa sua última morada: uma velha tradição de família.
O nobre pertencia a uma antiga família de guerreiros, cuja uma lenda dizia que padeciam de uma estranha maldição ou anomalia, herdada ao ganharem o poder por meio de um suposto pacto Demoníaco, que os faziam serem rejeitados pela própria terra quando morressem, transformando-os em mortos-vivos. O certo é que todos eram sepultados em criptas com grossas grades de ferro para que seus corpos não fossem de modo algum violados.


E era com ternura que ele se recordava da antiga casa, com seus inúmeros quartos, salas, corredores, escadarias; recordava-se de sua velha mobília, onde costumava brincar quando criança; de seus amplos bosques, que no outono tornava-se sombrio, com brumas e lobos a ruivar para a lua; e também de seus utensílios domésticos, em que serviçais lhe serviam chá enquanto sua mãe lhe contava as histórias mais sangrentas das batalhas travadas por seus antepassados.
O casarão, que há muitos anos havia sido abandonado, situava-se em uma terra inóspita, em um pequeno povoado, evitada por ladrões e aventureiros, que traziam estranhas histórias de criaturas monstruosas, capazes de despedaçar um homem com suas poderosas mandíbulas.
E após alguns dias de cavalgada, sob sol e chuva, finalmente, a pequena comitiva havia se deparado com telhados de altos casarões de uma pequena cidade que, ao longe, parecia comprimida entre gigantescas montanhas que lhe fazia mergulhar em um espesso véu de sombras, lhe dando aspecto sombrio e aterrador de um eterno crepúsculo, mesmo em um dia claro de verão. O que lhe originou o nome de Cidade das Sombras.
Após descerem de suas montanhas íngremes, e caminharem ao longo de suas ruas, por entre velhas casas abandonadas, avistaram o velho casarão, com seus muros e seu imenso jardim sombrio.
O conde tomou a chave, que carregara no pescoço, e abriu seu imenso portão, adentrando em seu longo jardim; e ao transpor, seguiu para seu interior. Tirou os panos que protegiam as velhas mobílias de uma de suas salas; tirou o pó e as teias de aranhas, que há anos encobria seus belos castiçais, e acendeu alguns; e em seguida, movido por uma curiosidade infantil, percorreu alguns de seus longos corredores, em direção a um grande mistério que a casa guardava, um lugar que nunca lhe era permitido quando criança: a antiquíssima biblioteca da família.
Ao chegar à porta, mandou que seus empregados esperassem do lado de fora. Ao entrar, viu as imensas colunas que formavam estantes gigantescas tomadas por milhares de livros volumosos. Eram livros de magia e alquimia, que só podiam ser lidos se fossem carregados com dificuldade e postos sobre imensas escrivaninhas. Viu também que havia dezenas de quadros em suas paredes. Tomou o castiçal e foi olhá-los de perto. Eram retratos de pessoas disformes, assustadoramente monstruosas, que pareciam se decompor a olhos vistos, porém, lhe pareciam ser familiares, que haviam sido eternizadas, curiosamente, em quadros horríveis
Por fim, cansado, deitou-se ao lado da parede que abrigava todos aqueles velhos quadros, e adormeceu... Acordou com o vento frio que vinha da parede ao lado, foi quando, estranhamente, percebeu que os quadros havia desaparecidos, e em seus lugares havia agora dezenas de janelas. Percebeu então que na verdade a todo tempo havia sido observado por meio destas. Foi quando entendeu, com imensa alegria, que estava de volta à sua velha família. 

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