Durante a década de 1980, tornou-se bastante popular a ideia de que usamos apenas 10% de nosso cérebro, o
restante estaria esperando para ser usado por nós; uso que aumentaria
consideravelmente a inteligência e a memória de seus usuários. Havia até a
ideia de que alguém que conseguisse usar mais do que os 10% de seu cérebro
seria capaz de desenvolver poderes como telepatia, movimentar objetos com o
poder da mente (telecinésia), prever o futuro (premonição) etc.
Algumas Pessoas Conseguem, devido a Acidente ou Doenças, Viver Bem com apenas uma Pequena Parte de um Cérebro Normal, o que Motivou a Crença de que não Usamos toda a Capacidade de Nosso Cérebro |
E embora essa
ideia tenha caído com o passar do tempo em desuso, devido a um melhor
conhecimento sobre o cérebro humano, de suas funções e do descobrimento de que
nem toda matéria do cérebro tem a função de pensar, ou seja, o cérebro humano
não é feito de 100% de matéria pensante, o que derrubou a tese de
aproveitamento de 100% da matéria de nosso cérebro para a função de
conhecimento, inteligência, memória. Porém, nem tudo ainda sabemos sobre o
cérebro humano: muitos mistérios ainda desafiam os cientistas.
Um incrível mistério
surge quando são analisados cérebros de adultos com atividade mental normal que
tiveram hidrocefalia quando criança, que tem inculcado muitos neurocientistas.
Criança com Hidrocefalia |
A hidrocefalia é uma
doença que afeta crianças, e que se caracteriza pelo cérebro absorver em
demasia liquido, fazendo-o expandir e aumentar de volume. Pelo fato de crianças
não terem ainda o crânio totalmente formado, a hidrocefalia faz com que a
criança tenha uma cabeça desproporcional ao corpo. “Cirurgiões são capazes de
drenar o fluido em excesso, de modo a aliviar a pressão. Se forem bem sucedidos,
a expansão cerebral é revertida e o tamanho da cabeça retorna ao normal. Quando
a operação é realizada mais cedo, antes de os ossos do crânio começarem a se
fundir, uma criança pode esperar uma vida normal”.
John Lorber (1915 - 1996) |
À Esquerda, Vista de um Cérebro com Defeito em Sua Estrutura devido a Hidrocefalia: a Parte Escura Significa Ausência de Matéria Cerebral; à Direita, um Cérebro Normal |
A pesquisa de John Lorber
encaminhava para a ideia de que, se pessoas com apenas 5% de um cérebro normal
eram capazes de viver tendo a mesma capacidade intelectual de pessoas com os
100% de cérebro, então havia uma disparidades entre o tamanho do cérebro e o
seu suposto conteúdo informacional, ou em outras palavras, a pequena quantidade
de cérebro nessas pessoas era capaz de absorver uma quantidade de conhecimentos
muito maior do que parecia ser seus cérebros capazes.
Para
John Lorber a explicação para isso se devia ao fato de que as estruturas cerebrais que eram
relativamente poupadas na hidrocefalia, e que representariam apenas 5% de um
cérebro normal, teria permitido aos seus usuários ter vidas normais, de
modo que haveria uma quantidade enorme de parte do cérebro normal que estaria simplesmente esperando ser usada, pronta para agir em caso de necessidade. Isto significaria que grande parte do cérebro normal estaria simplesmente inativa. Ou seja, a explicação que Lorber dá para
este fenômeno se assemelha ao mito dos 10% de cérebro usado, comentada no início
desta matéria (penso até que foi devido a suas ideias que se originou essa tese).
Lorber apresentou suas
descobertas em uma conferência em 1980, sob o título “Seria o Seu Cérebro
Realmente Necessário?”. Ele não encontrou apoio para suas ideias na comunidade
científica. Alguns o acusaram de estar sendo “exageradamente dramático”.
John Lorber morreu em
1996 com 82 anos, com suas ideias totalmente esquecidas.
Todavia, com o tempo as
questões levantadas por John Lorber ressurgiria novamente, através de dois
casos:
Sob o título “Brain of a
White-Collar Worker”, neurologistas franceses relataram um “alargamento
ventricular massivo” [parte escura, demonstrando ausência de matéria cerebral, do cérebro central na figura acima] na varredura do
cérebro de um funcionário que era casado, com dois filhos, e chegou a eles com sintomas
neurológicos relativamente leves que responderam ao tratamento (Feuillet et
al., 2007). E neurocirurgiões brasileiros relataram mais tarde um caso
semelhante (figurado centralmente na Fig. 1; de Oliveira et al. 2012.
Mais tarde casos
semelhantes de pessoas com pouquíssima quantidade de cérebro, mas com memória
excepcional foram encontradas, em casos de microcefalia e síndrome de savant.
Neurologistas atuais, diferentemente de John Lorber, tentam explicar este fenômeno através do grande poder do cérebro humano de se adaptar a novas situações por meio de sua capacidade de reassumir e reorganizar suas funções. Isto significa que uma parte de outra forma ocupada do cérebro pode mudar para reassumir uma nova função em lugar da parte que foi destruída, compensando a parte defeituosa.
Contudo, esta explicação também tem seus inconvenientes, já que deve haver um limite em que o cérebro perdeu tanto de sua matéria que não tem mais partes sobressalentes para assumir novas funções, e assim a explicação falha.
Neurologistas atuais, diferentemente de John Lorber, tentam explicar este fenômeno através do grande poder do cérebro humano de se adaptar a novas situações por meio de sua capacidade de reassumir e reorganizar suas funções. Isto significa que uma parte de outra forma ocupada do cérebro pode mudar para reassumir uma nova função em lugar da parte que foi destruída, compensando a parte defeituosa.
Contudo, esta explicação também tem seus inconvenientes, já que deve haver um limite em que o cérebro perdeu tanto de sua matéria que não tem mais partes sobressalentes para assumir novas funções, e assim a explicação falha.
Na tentativa de explicar
como pode alguém com apenas 5% de um cérebro normal ter a mesma capacidade
mental de uma pessoa com um cérebro normal, criou-se três tentativas de
explicação:
“1. As memórias de longo
prazo são guardadas dentro do cérebro de alguma forma química ou física
consistente com o conhecimento atual da química e da fisiologia cerebral”.
“2. As memórias de longo
prazo são guardadas dentro do cérebro em alguma forma extremamente pequena,
subatômica, ainda desconhecida pelos bioquímicos e fisiologistas. Aqueles que
testemunharam nas últimas décadas o grande aumento no poder dos computadores
para armazenar grandes quantidades de informação em espaços cada vez menores
não devem se surpreender se evidências para esta alternativa eventualmente
surjam”.
Agora a explicação mais
surpreendente:
“3. As memórias de longo
prazo são guardadas fora do cérebro. Como a maioria dos tecidos não neurais e
órgãos parecem inadequada para esta tarefa, isso leva a memória de longo prazo
a estar fora do corpo — extracorpórea! Por incrível que pareça, esta
surpreendente alternativa tem sido analisada por pelo menos duas décadas. Um
professor em ciência da computação da Universidade de Georgetown esboçou como
poderia funcionar (Berkovich 1993, 2014). Um árabe médico-filósofo do século X
até tinha uma versão (Avicenna 1631)”.
Um modo de explicar esta
hipótese seria comparar o cérebro humano com um computador, cuja memória não
estaria nele, mas exterior a ele, na internet, e assim como um computador, o cérebro
humano seria apenas um terminal de acesso de algo exterior, que poderíamos
chamar de alma. Assim esta alma, diferentemente da concepção tradicional, não seria
algo interior ao corpo do ser humano, mas exterior a ele.
“Desenvolvendo a tese [...]
de que o tamanho do cérebro humano não se adéqua com o seu conteúdo
informacional, argumenta-se que o âmbito das explicações possíveis não deve
excluir o armazenamento de informação extracorpóreo”.
Aguardemos que
descobertas futuras possam nos esclarecer melhor sobre estas três formas de
explicar o mistério do funcionamento do cérebro humano. E a ideia de que conteúdos
mentais, como a memória de longo prazo, possa ser exterior ao cérebro humano não pode ser ainda
descartada.
*Este texto teve como base o artigo, que pode ser lido na íntegra: Evidências Neurocientíficas Para uma Memória Extra-Cerebral, do bioquímico britânico Donald R. Forsdyke.
*Este texto teve como base o artigo, que pode ser lido na íntegra: Evidências Neurocientíficas Para uma Memória Extra-Cerebral, do bioquímico britânico Donald R. Forsdyke.
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