sexta-feira, 23 de setembro de 2011

EU E KEROUAC (de Haroldo Brandão)


                “Para mim só contam os que são loucos por alguma coisa, loucos por viver, loucos por falar, loucos para serem salvos, os  que querem tudo ao mesmo tempo, os que jamais bocejam, que não dizem banalidades, mas ardem, ardem, ardem como um fogo de artifício.” (Jack Kerouac)

Todas as vezes eu me trancava no quarto e não queria ver ninguém, a ressaca física e moral estava no auge e eu começava a pensar que meu tempo já era, incorrigível perscrutador do próprio umbigo olhava as pernas e achava que minha porção besouro estava se revelando. Com o travesseiro eu esmagava minha cabeça e a culpa me corroia o corpo todo, há muito tempo me inscreveram em uma história que ainda iria acontecer, não há genealogia segura mas Virgínia nos anos 30 deu para um grandississimo  filho da puta e como resultado nasceu o futuro, correto, fiel e disciplinado contador, aquele que escapou de uma prisão e caiu nas garras da minha mãe. Talvez aí esteja a origem de toda a minha teimosia, dor e falta de paz. Os cabelos grisalhos avisam  que o corpo já está saturado de som e rock’n roll mas as ruas, as luzes, as noites hipodérmicas me chamam e eu me sinto o super-homem nos paraísos- bares artificiais.  Como toda ilusão, feito miragem no deserto aquilo desaparecia e me vejo perdido entre o inferno e o céu. As costas de Deus estão pesadas e desconfio que não haverá salvação; onde a luz? Que luz?

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