sexta-feira, 19 de maio de 2017

O COLECIONADOR DE CABEÇAS


O COLECIONADOR DE CABEÇAS
SEU CORPO AO CAIR DO CADAFALSO, pendurado pela corda que lhe enforcava, se debatia, pairando no ar. Suas pernas se contorciam, agitando-se desesperadamente, como se dançassem uma dança frenética, uma última dança, a dança da morte.
E enquanto seus olhos se arregalavam e sua língua se estendia em direção ao chão, com a rapidez de um raio, pôde recordar do grande mal que havia feito...
Seu nome: Hans Brünner, médico alemão, cuja fama teria levado a alguns a afirmarem que este era a prova de que Deus não existia, ou pior, que era tão mal quanto seu anjo maldito.
Brünner era um dos médicos encarregado, naqueles dias, de pesquisar modos de aliviar e reanimar soldados alemães feridos em combate, na segunda grande guerra. E como Menguele, o anjo da morte, poucos foram tão implacáveis com seus prisioneiros. Para tanto, dissecava corpos de prisioneiros ainda vivos, submetidos a câmaras de baixa pressão. Muitos tiveram o cérebro dissecado enquanto estavam vivos. E após ver as bolhas de ar que se formavam no sangue dos cérebros de suas “cobaias”, Hans Brünner exclamava: "Sou, sem dúvida, o único que conhece por completo a fisiologia humana, porque faço experiências em homens e não em ratos". Brünner “injetou tinta azul em olhos de crianças, uniu as veias de gêmeos, jogou pessoas em caldeirões de água fervente, amputou membros de prisioneiros, dissecou anões vivos e coletou milhares de órgãos em seu laboratório”, tudo em nome da superioridade da raça alemã.
Brünner tinha verdadeiro amor por sua coleção de cabeças decepadas, que sempre conseguia novas comandando o programa que exterminava doentes mentais, ou como preferia chamá-los: “vida indigna de viver”. E entre as muitas cabeças de sua coleção uma lhe era preferida: a pequena cabeça de uma criança de cinco anos, deformada pelos horrores da segunda grande guerra.
Sua mãe a todo custo tinha lhe dado a vida, mesmo após uma terrível intoxicação por gás venenoso, lembrança terrível da primeira grande guerra. E a mantivera protegida do frio, do pânico e da fome. Em algumas ocasiões chegou alimentá-la, devido a escassez de seu leite, com seu próprio sangue, que escorria de sua mama ferida, de tanta a filha sugar. Tinha jurado jamais abandoná-la, mesmo sob todas as diversidades da vida ou da morte. E por essas coincidências inexplicáveis da vida, que a todo custo tentamos explicar, sua cabeça, do outro lado do corredor, olhava a cabeça da filha, docemente, com um leve sorriso nos lábios, em meio a centenas de outras cabeças decepadas.

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