terça-feira, 17 de julho de 2012

SOBRE O CONCEITO DE MALDADE





 
No dia 24 de maio, o então ator pornô Eric Clinton Kirk Newman, conhecido pelo nome artístico de Luka Rocco Magnotta, matou e esquartejou seu amante, um estudante chinês em Montreal, Canadá. O assassinato, bem como o esquartejamento, foi filmado e publicado na internet pelo próprio assassino. Nele podemos ver Magnotta cortando o cadáver, sodomizando o corpo mutilado, enfiando o gargalo de uma garrafa no ânus do mesmo, e até mesmo pondo um filhote de cão para lamber os ferimentos do corpo. Magnotta chega ao cúmulo de, munido de garfo e faca, cortar uma pequena parte das nádegas e, com a ajuda do garfo, supostamente comê-lo. Magnotta ainda enviou pelo correio partes do corpo para uma escola e um partido político no Canadá.
No mesmo mês de maio, Elize Matsunaga matou e esquartejou seu marido, o empresário Marcos Matsunaga, após uma discussão conjugal por conta de uma infidelidade que teria sido descoberta por ela. Elize despachou o corpo dividindo-o em três malas. Exames posteriores indicaram que Elize decapitou o marido enquanto este ainda estava vivo.
Em Barcarena, município do estado do Pará, a adolescente Daiane do Carmo Macedo, de 14 anos, foi encontrada seminua, em avançado estado de decomposição, amarrada em uma árvore, morta à terçadadas por seu padrasto e por um vizinho. Supõe-se que o crime tenha sido incentivado por motivos sexuais.
Ao ouvirmos comentários sobre casos de extrema violência como estes é comum que logo surja alguém (jornalistas, policiais ou populares) que - motivado pelo crescente movimento de patologização de criminosos, estimulado nos últimos anos, certamente, pela enorme popularidade de filmes policiais, que popularizaram a figura do serial killer (e consequentemente a do psicopata), e por uma imprensa que se dedica muito mais a julgar (na maioria das vezes de modo errado) do que ao seu papel fundamental, que é informar - tente explicar tamanha maldade recorrendo a ideia de doença ou distúrbios mentais, como psicopatia ou pedofilia, antes mesmo que especialistas se pronunciem sobre o tema; como se, pela gravidade dos casos, somente tivessem esta forma de explicação. Assim, ao ouvirmos o caso de Elize Matsunaga, é comum que ouçamos logo um “só pode ser uma doente psicopata para ser tão má”. Ou se um homem estupra uma criança é logo taxado de pedófilo, como se a extrema maldade só pudesse ser explicada por meio de distúrbios mentais.
O que acontece é que ao vermos casos extremos de violência temos dificuldade em aceitar que possa existir a maldade pela maldade, que um ser humano possa ser capaz de ato tão vil, optando por ser mau, e assim recorremos a explicações exteriores a vontade humana como forma de explicação. Porém, ouso dizer-lhes, independente das possíveis explicações para cada caso em si, claro: A EXTREMA MALDADE EXISTE INDEPENDENTE DE QUALQUER IDEIA DE DOENÇA. O SER HUMANO NORMAL É PERFEITAMENTE CAPAZ DAS PIORES ATROCIDADES. E vou além: não apenas a imediata associação entre doença mental e maldade é apressada e superficial, quanto sem sentido. Isto não quer dizer que um doente mental não possa prejudicar uma pessoa, muitos fazem, mas sim que ele não pode ser taxado de mau, pois o conceito de maldade é incompatível com o conceito de doença mental, já que exige capacidades que um doente mental não as possui, pelo menos no ponto mais alto de sua doença, como:
1º. PLENO CONHECIMENTO DE SEUS ATOS: Para que possamos denominar alguém de “mau” torna-se necessário que este alguém tenha pleno conhecimento de seus atos e de sua maldade. Em outras palavras, que tenha pleno conhecimento de estar fazendo mal a alguém. Por isso não se pode chamar de maldade os atos violentos que por ventura um doente mental possa causar durante um surto de loucura, ou danos físicos ou psicológicos causados não intencionalmente a outro.
2º. LIBERDADE DE ESCOLHA: A pessoa para quem possamos chamar de “mau” tem que ser capaz de se decidir entre a bondade e a maldade, já que não podemos culpar alguém que fez o mal por falta de opção. Por isso, também não se pode chamar de mau a alguém que cometeu um ato mau forçadamente ou por ignorância; que não teve a liberdade de optar entre os valores de bondade e maldade, para que sua maldade possa ter sido intencional. Como o caso de alguém que usou de violência para manter-se vivo.
E finalmente:
3º. VALORES MORAIS: O conceito de maldade exige que a pessoa denominada de “mau”, seja portadora de sentimentos humanitários, haja visto que optamos entre a maldade e a bondade com base em tais sentimentos.
Por isso apenas o ser humano pode ser considerado mau: outro animal quando mata, esquarteja, devora outro de sua espécie não faz por opção, mas pelo poder irresistível de seus instintos; e isto apenas em último caso: quando coagido pela fome ou pela continuidade de sua descendência. Mas no homem isto pode ser uma questão de opção, isto é, um homem pode preferir estuprar e/ou matar crianças pelo simples fato de serem mais indefesas do que adultos, ou mais fáceis de serem ludibriadas. O que explica porque nunca vemos serial killers de lutadores de vale-tudo, por exemplo.
 Em suma, o conceito de maldade é um conceito filosófico e jurídico, NÃO PSIQUIÁTRICO, que serve para definir tanto a culpabilidade de alguém quanto atos criminosos, como o assassinato; e quando seus pré-requisitos não podem ser aplicados a alguém, este alguém é tido pela lei como inimputável, isto é, é incapaz de ser responsável por seus atos. O que pode abrir um precedente perigoso nesses tempos em que todo comportamento que fuja da ética, da moral ou dos chamados “bons costumes” é imediatamente associado a uma doença, levando muitos criminosos a se aproveitarem disso. E sendo um conceito mal interpretado causa tanto erros populares - que vê as doenças e distúrbios mentais como as únicas explicações para tanta maldade, não deixando perceber que alguém pode ser mau simplesmente por querer ser mau, por tirar vantagem disso, por ser um grande escroto filho-da-puta - quanto erros de especialistas, como o da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa, que em seu livro Mentes Perigosas – o perigo mora ao lado, chega, erroneamente, a denominar a psicopatia como “doença da maldade”.
Seria ela mais uma partidária da patologização desenfreada da maldade ou estaria na verdade se aproveitando disso, com a crescente venda de seu livro?  

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