quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

DAMARES E AS FAKE NEWS SOBRE A ILHA DE MARAJÓ





DAMARES E AS FAKE NEWS SOBRE A ILHA DE MARAJÓ


Recentemente a cantora paraense Aymeê Rocha em um programa de reality gospel, cantou a música de sua própria autoria “Evangelho de Fariseus”, que faz duras críticas aos próprios evangélicos: 


“O Reino virou negócio.

O dízimo importa mais do que os corações.”


A música também faz alusão a situação das crianças na ilha de Marajó/Pa:


“Ah, um evangelho de fariseus

cada um escolhe os seus

E se inflamam na bolha do sistema

Ah, enquanto isso, no Marajó

O João desapareceu

Esperando os ceifeiros da grande seara”.


Contudo, mesmo a crítica na música feita ao papel dado ao dízimo nas igrejas evangélicas atuais ter sido extremamente polêmica, devido ter sido apresentada em um programa evangélico e na presença de vários pastores, o que chamou a atenção dos jurados do programa não foi a crítica ao dízimo mas a citação da ilha de Marajó, que passou a ser debatido após a cantora ter terminado de cantar sua canção.


Questionada sobre o que a inspirou a compor tal música, Aymeê respondeu que foi os casos de pedofilia acontecidos na ilha de Marajó.


“As famílias de lá [ilha de Marajó] são muito carentes. Criancinhas de 6, 7 anos saem numa canoa e elas se prostituem dentro do barco por 6 reais”, disse a cantora aos jurados.




Aymeê também comentou que há em Marajó “tráfico de órgãos”.


O vídeo com os comentários da cantora sobre a ilha de Marajó logo foi compartilhado milhares de milhares de vezes pelas redes sociais, assim como vídeos falsos com supostas cenas de pedofilia acontecido em outros lugares, não na ilha de Marajó. 


O vídeo de Aymeê Rocha também ressuscitou um antigo vídeo da ex-ministra do governo Bolsonaro sobre as supostas atrocidades cometidas contra crianças em Marajó.


Damares e as Bonecas Sexuais da Deep Web


Em vídeo, quando era ministra do governo Bolsonaro, a atual senadora Damares, afirmou ter informações gravíssimas sobre o tráfico de crianças na ilha de Marajó; disse ela em um culto em Goiânia:


“Nós temos imagens, de crianças nossas, brasileiras, com 4 anos, 3 anos que, quando cruzam as fronteiras sequestradas, os seus dentinhos são arrancados, pra elas não morderem durante o sexo oral. Essa nação que a gente ainda tem, irmãos. Nós descobrimos que essas crianças comem comida pastosa pro intestino ficar livre para a hora do sexo anal”.


O Ministério Público cobrou de Damares as provas de que haveria, de fato, o que ela afirmava acontecer na ilha de Marajó. Damares respondeu que não tinha nenhuma prova; que teria apenas ouvido falar de tais atrocidades.




O relato da ex-ministra Damares se assemelha bastante à uma lenda urbana surgida durante o começo dos anos 2000, das chamadas “bonecas sexuais”.


Dizia-se que, pela Deep Web, um médico vendia bonecas sexuais humanas. Para isso ele recolhia crianças de orfanatos de países pobres do leste europeu, cortava-lhes os braços, pernas e as cordas vocais, para evitar que fugissem e gritassem; tirava-lhes os dentes e os substitua por dentes moles de silicone, para que evitassem morderem durante o sexo oral; e estas crianças deveriam ser alimentadas por comida pastosa. Desta forma as crianças eram transformada em uma espécie de boneca que ficariam a mercê dos gostos sexuais de seus algozes.




A existência de tais bonecas sexuais nunca teve qualquer indício de que existiriam, pois era apenas uma lenda urbana de internet. Parece que Damares a teria adaptado à ilha de Marajó.


Tráfico de Órgão na Ilha de Marajó?

Lucas Hayashi no Inteligência Limitada

A fala de Aymeê Rocha, como era de se esperar, também trouxe à tona denúncias feitas por ongs evangélicas. 


Recentemente, no pod cast Inteligência Limitada, o pastor Lucas Hayashi da igreja Zion Church, foi confrontado pelo fato de que ele teria dito de que na ilha de Marajó teria sido descoberto um cemitério com corpos de crianças e adultos encontrados sem órgãos internos, insinuando a grave existência de tráfico de órgão na região. E ao ser perguntado se ele poderia dizer onde estaria este cemitério, já que nem mesmo a Polícia Federal sabia algo sobre, o pastor, assim como fez Damares, afirmou que apenas teria ouvido falar.


É estranho a afirmação de tráfico de órgãos em Marajó, já que a extração e conservação de órgãos humanos para transplante requer um grande aparato médico, e o rápido transporte do material até aquele que irá recebê-lo, exigindo transportes rápidos, como o uso de helicópteros e aviões, e um hospital bem aparelhado para o transplante; uma estrutura que a ilha de Marajó não possui, e chamaria atenção se tivesse algo semelhante e ilegal na região.


Miséria e Abandono


A ilha de Marajó tem denúncias de pedofilia, miséria e falta de amparo político, como vários lugares de nosso país, que merecem tanto atenção quanto Marajó, não sendo problemas exclusivos da ilha. Agora levantar denúncias gravíssimas sem que seja apresentada a menor evidência a favor, parece ser má fé.


Parece que o que há por trás de todas essas graves denúncias, sem quaisquer evidência, e que tem chamado bastante atenção da mídia para a ilha, tem como causa motivações políticas e interesse de organizações religiosas que aproveitam o momento para se promover, arrecadar fundos e ganhar cada vez mais influência política sobre a região. O que fica claro nas próprias palavras do pastor Lucas Hayashi (um dos membros da família fundadora da igreja Zion Church), que disse no referido pod cast: “Nós temos que ser a voz das crianças, nós temos que ser a voz da população marajoara”. Ou seja, Hayashi acaba atribuindo a si e a sua igreja o papel que é dado ao governo do estado do Pará de representar, de forma constitucional, a população da ilha de Marajó. 

Um comentário: